Que sociedade é esta em que a prefeitura precisa mobilizar servidores e dinheiro de todos os contribuintes para limpar o quintal de uma casa? Que sociedade é esta em que no meio de uma epidemia uma pessoa não mostra preocupação com sua parte, em não prejudicar os vizinhos e, pior, não se toca que ele mesmo está em risco? Não deveria ser assim.

Que sociedade é esta em que mesmo após toda a divulgação dos casos, após as mortes de pacientes ganharam destaque estadual e até nacional em redes de televisão ainda aparece gente despejando entulho de forma irresponsável, ignorando avisos oficiais de que é preciso limpar o quintal?

Que sociedade é esta em que cidadãos comuns, empresas, comerciantes, donos de imóveis fechados deixam lixo, carros velhos e todo tipo de carcaça abandonada ampliando o risco que é de todos, de qualquer um, tratados como se fossem de ninguém?

É uma sociedade errada, com um bom número de cidadãos errados. 

E é a mesma sociedade em que foi preciso formar-se um quadro de epidemia para que surjam decisões inovadoras todos os dias depois de quase 12 meses de uma inércia acomodada. A mesma sociedade que famílias choram a morte de pessoas queridas enquanto as medidas oficiais de controle servem a coletivas de imprensa, vídeos, discursos e avisos de cobertura.

E a sociedade aceita. Quem protestou há três meses? Quantos cidadãos estavam preocupados com a dengue em começo de dezembro? Os cidadãos errados dão espaço a um poder público errado, abusivo, desleixado. É a mesma sociedade, dois lados da moeda. Com a primeira difrença brutal: um lado pago, o outro recebe e gerencia o dinheiro.

A sociedade em que é preciso o poder público ensinar a limpar quintal é a mesma em que tribunais, promotores, ações civis, representações são obrigadas a lembrar os limites da lei, os direitos do cidadão, as obrigações do administrador. E um bom número de cidadãos aceitam.

A mesma sociedade que espalha lixo é a que enfrenta falta de opções para destinar entulhos, que não tem coleta seletiva, não tem destinação adequação de fácil acesso, não tem sequer orientação para ajudar o morador a entender como jogar sofás, lonas, latas e ferro velho fora. A mesma cidade que vê carros abandonados em fila em bairros populares, tem meses do mais absoluto descaso a pedido de operação simples de tapa buracos ou limpeza de terrenos. Uma sociedade de ignorados.

É a mesma sociedade em que cidadãos telefonam repetidas vezes para falar dos imóveis abandonados e cheios de tralhas nos vizinhos  e que antes da dengue já acumulam ratos, caramujos, baratas e outros insetos sem nada acontecer, sem sequer uma resposta por telefone.

A sociedade onde muitos estão longe de aprender a serem cidadãos é a mesma onde o poder público segue longe, longe, de ser o representante das vontades populares, o gestor dos interesses coletivos, o poder dedicado  atender a coletividade.

E chegamos à segunda diferença brutal: o poder público aprende e usa rapidamente os meios de lembrar ao cidadão que ele tem obrigações. O cidadão capenga em cobrar do poder público. E isso já é boa parte da explicação para entender porque existe uma coletividade assim. Então cidadão, faça o favor de cuidar de seu quintal e de cuidar de seus políticos. Você mantém os dois, os dois podem fazer mal a você, seu vizinho, sua família.