Um amigo do amigo (de raríssima fabricação humana) apresentava argumentos ao amigo do inimigo: de estilo bem comum, era um crítico nacionalista.
O diálogo de surdos seguia assim:
Amigo do amigo – Não se deixe levar como piolho que anda pela cabeça dos outros. Veja bem: “Senso comum não é nada mais do que um depósito de preconceitos colocados na mente antes de fazermos dezoito anos” (do livro Mathematics, Queen and Servant of the Sciences, 1952; Eric Temple Bell).
Amigo do inimigo: “Só tenho preconceito contra quem não quer ganhar dinheiro”.
Amigo do amigo – Rapaz, preste atenção: “Se A é sucesso na vida, então A é igual a X mais Y mais Z. X é trabalho. Y é diversão, e Z é manter sua boca fechada!” (Observer, em 15 de janeiro de 1950)
Amigo do inimigo: “Por que não fecha a sua e me deixa ganhar o meu em paz?”.
Amigo do amigo – Tenha educação e um mínimo de bom senso, se é que me entende. Afinal: “Meu apaixonado senso de responsabilidade social sempre contrastou com minha pronunciada ausência de necessidade de contato direto com outros humanos. Eu sou realmente um ‘viajante solitário’ e nunca pertenci a meu país, meu lar, meus amigos ou mesmo à minha família com todo meu coração. Mesmo com todos estes laços, nunca perdi a necessidade de estar sozinho”. (The World as I See: An Essay)
Amigo do inimigo: “Tenho responsabilidade é comigo mesmo (sic) e com a família que tenho de encher a boca de comida”.
Amigo do amigo – Não há nada de errado em estruturar sua família. Mas: “Nada realmente valioso nasce da ambição ou do mero senso de dever. Só surge do amor e da devoção pelos homens” (The Human Side: Glimpses from His Archives)
Amigo do inimigo: “Meu dever me diz que devo encher você de porrada”.
Amigo do amigo – Por favor, entenda que a vida não se resume a ter. Porque: “A mais linda experiência que podemos ter é o sentido do mistério. É a emoção fundamental, berço da verdadeira arte e da verdadeira ciência. Aquele que nunca teve essa experiência parece-me que, se não está morto, está cego”.
Amigo do inimigo: “Que baboseira misteriosa é essa? Quero minha parte em dinheiro, você pode sonhar acordado se quiser”.
Amigo do amigo – Não me rendo ao “Poder Nu”: “Sempre viverei em você, assim como morreria pela Humanidade”.
Amigo do inimigo: “Você é louco varrido, usa roupa de palhaço. Eu ando na moda, com roupas de ‘marca”.
O amigo do amigo se vestia com um capote abotoado até o pescoço e só tinha chinelas.
No final de seu arrebatamento, o brasileiro da gema que criticava o cientista convidado, ainda o acusou de usar um pensamento não-lógico.
Esquecia-se o amigo do inimigo que se tratava de Albert Einstein (morto há exatos 60 anos).
Para saber mais dessa conversa, há duas indicações abaixo:
EINSTEIM, A. Escritos da Maturidade: Ciência, Religião, Racismo, Educação e Relações Sociais. Rio de Janeiro : Editora Nova Fronteira, 1994.
____ O poder nu. São Paulo : Rotterdan Editores Ltda, 1994.