ESTADO E PODER POLÍTICO - Macro e micro poder

O Estado corresponde ao Poder Político maiúsculo. O poder político, minúsculo, refere-se a determinadas formas políticas de organização, porém, não-organizadas na forma tradicionalmente apresentadas como estatais. Caciques e anciãos indígenas ilustram o que é poder político.

Além disso, os poderes políticos podem ser representados de diversos modos: um partido político é uma força política, todavia, só será um poder político efetivo se angariar forças para interferir no cenário global; sindicatos, ONGs (Organizações não-Governamentais), movimentos sociais também são forças políticas, mas vale a mesma regra que se atribuiu aos partidos políticos.

Sem manifestação inequívoca de poder, obviamente, não há poder político. O poder existe, de fato, quando é manifesto. Quando está latente, diz-se que há uma “potência de poder” ou que o poder é virtual. Muitas vezes entendido como força, o poder ainda requer algum consenso.

Igrejas ou religiosidades podem ser exemplos de poder político, quando no Congresso Nacional – sob a chamada Bancada da Bíblia – conseguem aprovar leis que interferem na vida coletiva.

Uma liderança individual pode aglutinar em seu entorno muito poder político e, neste caso, poderá tanto monopolizar o Poder Político (Estado) quanto minar o ocupante do cargo executivo.

A este indivíduo – especialmente se estiver dotado de discursos e de ações salvacionistas – atribui-se um poder quase imperial. E isto corresponde à alcunha de cesarista, pois empresta características político-militares que remontam ao general romano Caio Júlio César. Seguem-se aqui as lições do pensador italiano Antonio Gramsci – no livro Cadernos do Cárcere, volume III, “Nicolau Maquiavel”, 2000.

É claro que nem mesmo Hitler – o mais cesarista de todos os condottieri (chefe político e militar) depois do próprio César – pode reinar sozinho. Robinson Crusoé, isolado na ilha paradisíaca, não tem poder algum. Ainda que se possa negar o direito à vida, matando-se, o poder exige que se estabeleça uma relação social; logo, Crusoé não pode exercer poder sobre si mesmo.

O Füher (condutor) do nazismo alemão aliou as três condições expostas pelo sociólogo alemão Max Weber para manter sua opressão: dominação carismática (com o poder da revelação), racional-legal (legalizou e institucionalizou o nazismo) e tradicional (impostando-se como continuador do Mito Ariano que vem desde Armínio ou Hermann: líder tribal germânico).

Pois bem, ao redor de todos os líderes cesaristas, formam-se estafes e grupos de poder que o auxiliam ou o empurram em direção a um sentido muitas vezes mais amplo e até desconexo do interesse original. O fato é que sempre estará em disputa o Poder Político.

O deputado Eduardo Cunha (economista e evangélico neopentecostal) é um tipo específico de político cesarista. Evidentemente que almeja mais poder político para si e para as legendas que representa. Contudo, apesar de pessoalmente não ter carisma, articula-se com outros grupos de poder político que lhe dão base para agir contra o Poder Político.

Até 2015, Cunha era inexpressivo. Ganhou projeção com os ecos cesaristas que pretendem desconstituir os mandatários do Poder Executivo. Sob a análise de Antonio Gramsci, o deputado Eduardo Cunha é um político cesarista regressivo e repressivo. É hoje um baluarte dos que pretendem galvanizar o processo civilizatório – é óbvio que se opõe ao projeto da homofobia e da taxação sobre o grande capital.

Em suma, Cunha se alinha à pauta política que deslegitima direitos sociais, coletivos e difusos. Incita, por meio de proposituras legais, discursos de intolerância e de ódio: a “cristofobia”, como crime hediondo, prevê severas punições para quem não for cristão.

Como ocorre em toda medida de exceção, o direito de César deslegitima o direito do povo. Ao se defender o direito de ser cristão, revoga-se o direito de não sê-lo: serão severamente punidos os ateus, agnósticos, pagãos e críticos da religião neopentecostal.

Se não bastasse tudo isso, por analogia, os praticantes do sincretismo religioso (religiões afro: Candomblé, Umbanda, Vodu etc) também serão caçados pelo Estado de Direito que deixou de ser laico – se é que foi um dia. Com isso, ainda se vê a forma medievalista assumida pelo cesarismo político brasileiro. Inelutavelmente, vivemos tristes tempos, de sombrio cesarismo nazi-fascista.

Vinício Carrilho Martinez
Professor da Universidade Federal de São Carlos

Marcos Del Roio
Professor Titular de Ciências Políticas da UNESP/Marília