A arquiteta Roberta Pauli fechou temporariamente o escritório, mas pretende reabrir em novo endereço, quer dar aulas de artes para crianças, fazer novas exposições de suas obras e ganhar mais espaço em Marília. E enquanto isso deve começar a fazer palestras de autoajuda e autoconhecimento para contar sua experiência. Não é pouco coisa.
Em quatro anos, foram pelo menos três previsões de perda de mobilidade, fala e criatividade, além de quatro cirurgias invasivas e períodos de quimioterapia. Neste mesmo período, foram pelo menos três exposições de arte em Paris, Nova Jersey e Nova York, sem parar trabalho como arquiteta.
Aos 36 anos (todos dizem que ela aparenta menos), Roberta Pauli está em fase de exames de acompanhamento e de três em três meses faz ressonâncias para avaliar evolução após a quarta cirurgia para retirada de tumor na cabeça. Se tudo correr bem, logo ela poderá fazer os exames por semestre.
O tratamento, que reduz sua imunidade, provocou afastamento de outra paixão: aulas para crianças. Já desenvolveu o trabalho no Cacam (Centro de Apoio à Criança e Adolescente) Gacch (grupo de Apoio à criança com Câncer e Hemopatias). Quer retomar atividades.
Trabalhando em horários irregulares, escapou de tentativa de invasão e assalto quando entrava sozinha em seu escritório, ao lado da avenida Rio branco. Decidiu transferir e ainda busca novo espaço, outro projeto de 2016.
“Vou reabrir, até porque não para de aparecer projetos, tenho compromissos para fevereiro. Amo arquitetura. E pinto na hora que me dá na telha, até como terapia. Não é algo que me sinta obrigada a fazer.”
Chegou a pensar em parar de pintar. E viveu uma experiência que não só incentivou a produção como detonou um processo de mudança pessoal. Católica pouco praticante, produzia tela em aplicação de formas com estilo 3D quando a pintura revelou esboço da imagem de Jesus em um dos quadrados.
A tela ganhou o nome de Divino e foi divisor na vida da arquiteta, que passou a estudar espiritismo, inclusive com cirurgias espirituais em Franca, um centro neste tipo de atividade. Fez uma delas pouco antes de sua terceira cirurgia, que deveria ser mais invasiva.
“O médico havia me dito que era uma área muito sensível, eu teria perda de memória. E ele ficou surpreso, disse que o tumor aparecia no exame mas não estava lá. As cirurgias duravam sempre oito horas. Foram só cinco dessa vez.”
CONTRARIANDO MÁS PREVISÕES
Contrariar diagnósticos ruins não foi exatamente uma novidade. Quando descobriu o tumor após fortes dores de cabeça, em 2009, recebeu previsões como perda de visão, de criatividade e até de movimentos. Poucos meses depois começou a colecionar histórias de sucesso com sua obra
“Quando era adolescente havia estudado pintura de natureza morta e coisas assim. Abstrato foi uma descoberta para mim. Não me imagino pintando de outra forma”, diz a arquiteta, que celebras 15 anos de carreira, um bom volume de projetos e pedidos e especialização em planejamento e decoração de ambientes.
A pintura em lonas levou a arquiteta para decoração no projeto Casa Cor SP, onde teve contato com os organizadores da mostra de Mato Grosso, que a indicaram para participar do Leilão Objetos do Coração organizado pelo ator Otaviano Costa. O leilão arrecadou recursos para o hospital do cancer de Cuiabá.
Essa visibilidade abriu portas no exterior: primeiro uma mostra no Le Carrousel, um espaço de exposições itinerantes e revelações anexas ao Museu do Louvre, em Paris, depois galerias de arte em Nova Jersey e Nova York.
A arquiteta hoje tem pelo menos cinco obras à venda no exterior, convite para exposição em Miami e possibilidade de exposição na Livraria Cultura, polo de atividades culturais no Conjunto Nacional, na avenida Paulista em São Paulo.
“Acho que nunca vou poder considerar livre do tumor. Os exames acompanham essa evolução. Se fica mais rápida ou é muito intensa os médicos intervêm, foi assim que fiz as outras cirurgias. Mas penso que tenho muito a agradecer. Isso me mudou, acho que fiquei mais humana. Vi tantas pessoas em situações inimagináveis. Eu aproveito e posso aproveitar muito da vida. É isso que eu quero.”