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Identificação projetiva como instrumento de venda no cinema na televisão

Identificação projetiva como instrumento de venda no cinema na televisão

Em menos de dez anos, a indústria cinematográfica norte-americana evoluiu de filmes de baixo nível e exibições em bares repugnantes a um respeitável e complexo sistema econômico de produção, distribuição e exibição de filmes como forma de divertimento popular.

No final do século XIX, diante do lucro trazido pelas grandes audiências, os proprietários dos nickelodeons, como eram chamados os primeiros cinemas norte-americanos, vão expandindo seus negócios e criando redes de exibição. No início do século XX, por volta de 1908, já existiam nos Estados Unidos entre oito e dez mil salas, o que provocou um aumento brutal da demanda por uma programação mais diversificada.

Assim, antes de 1910 o cinema norte-americano havia se tornado uma forma de entretenimento familiar, pois as mulheres e filhos dos homens rústicos que dominavam anteriormente a platéia das primeiras salas de projeção também queriam conhecer a “novidade”.

A Primeira Guerra Mundial, que teve seu início em 1914, se tornou um golpe de sorte para os Estados Unidos: a produção europeia foi interrompida, pois o palco da guerra era lá, e assim inicia-se a indústria cinematográfica nos EUA, que começa a exportar para todo o mundo. Foi fácil, pois os filmes, que ainda eram mudos, não enfrentavam a barreira da língua. A grande arrancada que a Primeira Guerra Mundial representou para a indústria de cinema norte-americana também alavancou mudanças no conteúdo dos filmes, que passaram a ter enredos mais complexos, tornaram-se mais extensos e tecnicamente melhores.

Mas junto com seus filmes os norte-americanos também exportaram sua ideologia, assim impondo toda uma sorte de estereótipos que acabaram dominando o imaginário mundial, a exemplo das mulheres fatais, dos homens viris e aventureiros e das esposas “recatadas e do lar”.  

Estes estereótipos são consequência de um processo inconsciente denominado “identificação projetiva”, que já em 1930 torna-se o mecanismo-base das produções norte-americanas. Na identificação projetiva o espectador procura no filme algo que lhe recompense emocional e afetivamente das pressões que lhe perturbam o cotidiano, procurando compensar algo que não tem, ou que não é e gostaria de ser.

A identificação projetiva provoca a catarse, uma descarga de tensão emocional, deixando o espectador mais tranquilo, já que realiza um desejo inconsciente. Mas a catarse pode levar à alienação quando o espectador se apossa do conteúdo veiculado pelo cinema e acredita que faz parte daquela realidade, e não de seu cotidiano. E é justamente este o objetivo: para que ocorra a identificação e o espectador não pense na realidade, a maioria dos filmes, e depois as telenovelas, termina no pedido de casamento, no primeiro beijo, no embarque para a viagem – sempre no início do sonho, antes dos problemas.

Os maiores agentes da identificação projetiva são os atores e atrizes. O comportamento das estrelas na tela – e, principalmente, sua vida privada – costuma influenciar o comportamento da plateia. Além disso, a vida das estrelas também tem sua eficácia publicitária quando apresenta produtos usados pelos personagens que provocam a identificação dos espectadores.   Chamado de star system este procedimento sobrevive até hoje no cinema mundial, e mais fortemente na televisão naquilo que conhecemos como merchandising, que utiliza os personagens como gatilhos de venda de produtos diversos, de carros a maquiagens.

Ao atingir o receptor em suas necessidades, o cinema e a televisão tem como resposta uma maior audiência, ou seja, mais espectadores, e consequentemente mais anunciantes, e assim mais verba.  Tudo funciona como uma troca: ao aplacar o desejo do espectador, este é induzido a comprar aquilo que é anunciado.

Maria Inês Almeida Godinho – Roteirista e produtora, é mestre em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo. Docente da Universidade de Marília – UNIMAR/SP.