O STF (Supremo Tribunal Federal) está no meio da Lava Jato[2]. Todavia, por razões nem sempre esclarecidas – talvez por vaidade, talvez por reserva político-institucional do regime de castas –, o poder (investigador) ameaçado de investigação interrompe os processos investigatórios[3].

A mesma Ditadura Inconstitucional que se (retro)alimenta  do regime de castas é a que se beneficia da lei e da cultura de exceção. Pois, se não houvesse o intercurso da cultura de exceção, as prerrogativas constitucionais não seriam transformadas em privilégios.

Sem esquecer as picuinhas pessoais, administrativas, partidárias que animam a rotina seletiva da ditadura legal[4], deve-se ter em conta os desvios totalitários que agem sob a alcunha do Bem Maior:

“Mas, vejamos, a proposta de que prova ilícita, obtida de boa fé, deve ser validada, a priori, tem que ser muito criticada e se negar trânsito. Imagine, agora, um sujeito que é torturado, ah, mas foi de boa fé”[5].

Não há bons propósitos[6] acima da lei, dos princípios da licitude e da presunção de inocência, e dos postulados democráticos. No caso da última citação o que causa maior espanto é o fato de que só há indignação quando se faz referência direta aos “amigos da lei”. Ou seja, o regime totalitário em curso não ameaça apenas ao STF.

Pela lente angular do processo de impedimento, o impeachment de 2016 – como marco regulatório da Ditadura Inconstitucional –, tem matriz político-jurídica, quando, em acerto legal/legítimo, deveria ser o exato contrário: processo jurídico-político.

A diferença, que não é de mera sutileza verbal e nem de neutralidade demológica (porque não há regra neutra), deveria apontar a ocorrência inequívoca de crime de responsabilidade, com ato direto provocativo de dolo (art. 85 da CF/88).

Porém, no realismo político, basta a alegação (política) de um crime administrativo não-tipificado, que se denomina de “conjunto da obra”, para que se abra espaço a 55 projetos legislativos aniquiladores do Estado Democrático de Direito.

Neste sentido, não basta ser legal – ainda que muitas vezes nem se obedeça à legalidade que atinge o homem médio em sua vida comum[7] –, é urgente obedecer a uma moral democrática, popular, respeitosa ao senso médio nas condutas públicas[8].

Por sua vez, o pior é quando o mesmo poder, encarregado da justiça, pune os que se voltam contra seus privilégios de casta social. Juízes foram ameaçados, cerceados em direitos e liberdades por não defenderem a exceção.

Ao mesmo tempo, sente-se a invasão da força coercitiva das corporações pelos corredores e arredores do poder oportunista – e que, mesmo sendo complacente, incomoda-se com o arrocho[9].

A Justiça Social não tem caráter de urgência, mas os aumentos de salários, privilégios e status adquirido no establishment, sim[10]. A miséria humana verificada fora dos porões do poder coincide com o típico anti-Estado ou Poder Público privatizado.

Nessa toada, este modelo de Ditadura Inconstitucional segue a tragédia do capital, encontrando-se com um vasto caminho global que atende pelo codinome de Golpe de Estado internacionalizado[11].

Neste circuito ampliado pelo capital especulativo, disruptivo, os preceitos mínimos liberais, como liberdade e igualdade formal, cidadania participativa, Estado de Direito – que se oponha à barbárie jurídica –, são degenerados sob a figura do “inimigo combatente”: “o inimigo somos nós”.

Por fim, pode-se/deve-se dizer que a exceção dirigente da Ditadura Inconstitucional tem uma forma específica de fazer as coisas previsíveis nunca se realizarem, ao passo em que as imprevisíveis se contornam como a própria vida pública.

[6] Basta-nos pensar quem definirá o que são “bons propósitos”. Será o juiz? Em que bases morais-intelectuais? Com lastro em Kant, Conte ou em Marx, Gramsci, Adorno, Marcuse, Benjamin? Será o delegado? Ou virá na lei aprovada pelas bancadas serviçais do capital e aduladas pelo fim do Estado Laico? Quem sabe será o senso comum que ecoa na voz rouca das ruas, ressoando Balzac, Gorki, Reich, Brecht…