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Drogas – Internação de dependentes com dez anos muda hospital e impressiona

Hospital André Luiz, referência em atendimento, recebe crianças dependentes químicas
Hospital André Luiz, referência em atendimento, recebe crianças dependentes químicas

O Hospital Psiquiátrico André Luiz, de Garça,  tem nova estrutura e programas de atendimento. O motivo: receber crianças cada vez mais jovens dependentes de drogas. A internação de pacientes com dez anos e notícia de dependentes ainda mais novos impressiona até a equipe experiente da instituição.

As mudanças acompanham atualização de serviços iniciada em 2011, quando o hospital criou o projeto Construir e Crescer, destinado a atender meninas adolescentes usuárias de substâncias psicoativas – drogas, bebidas, remédios. Em 2012 a primeira surpresa. O hospital recebeu um adolescente prestes a completar 11 anos, o primeiro menino, o mais novo da turma.

“Foi difícil porque além de não atender meninos, tivemos que adaptar um espaço para o mesmo. Começamos a pensar em atender adolescentes do sexo masculino porque havia muita procura”, explica a psicóloga e administradora do Hospital, Eliana Boaretto.

Começaram a mudanças de estrutura. O hospital aproveitou uma ala desativada para instalar as meninas e acomodou os primeiros meninos. Construiu novo espaço para eles.

Uma rebelião de pacientes provocou destruição de colchões e vidros. E havia mais surpresas: após algumas iniciativas de famílias, começaram os encaminhamentos judiciais. Hoje, 60% dos adolescentes atendidos chegam ao hospital por determinação judicial após identificação de abandono e diferentes formas de violência.


Psicóloga Eliana Boaretto, administradora do Hospital Psiquiátrico André Luiz, em Garça – Arquivo Hospital

“Acredito que a maior violência que possa haver é a falta de apoio, afeto, carinho da família. Muitos que chegam até nós têm história de uso de drogas, trafico, prisão e prostituição na família.” Alguns relatam agressividade física de pais, padrastos, mães. Mas percebo que na maioria não há vinculo nenhum de afeto.

“Já vivenciei situações inaceitáveis com as famílias. Aquelas que são contra a equipe e codependentes do usuário. Há casos de pais que já trouxeram drogas para o hospital, familiares que organizam fuga junto com os filhos. Uma família trouxe tinner em garrafa de refrigerante para os meninos cheirarem.”

Em alguns casos o hospital identificou adolescentes que já atuam como traficantes e é difícil trabalhar com a criminalidade e violência em turma de tratamento médico. “Fomos preparados para atender e trabalhar com a dependência química e não com a criminalidade.”

As equipes de atendimento que fazem turnos de 12horas x 36horas têm liberdade para mudar de setor mensalmente. A pressão psicológica é grande. “Já tivemos funcionários ameaçados e outros agredidos inclusive pelas meninas. Temos que falar sempre a mesma linguagem com eles, ser firmes e ao mesmo tempo buscar alternativas que lhes agradam, que gostam.”

Há dois paciente com dez e 11 anos abaixo da faixa de idade definida pelo projeto. Os  meninos estão em uma ala central do hospital que está sendo reformada pela terceira vez porque todos os dias percebemos vulnerabilidade entre eles. 

“Ouvimos relatos de que aprendem a usar maconha com 7 anos. Normalmente há membros da família que fazem uso da droga. As drogas mais comuns são maconha, cocaína e crack.”

O atendimento é realizado voluntariamente ou involuntariamente. A maior parte envolve tratamentos financiados pelo Estado. Os valores cobrem gastos, mas o pagamento atrasado compromete este equilíbrio. Há opções de atendimento por convênios e particulares.

Há também os casos de participação muito positiva da família. A equipe trabalha a reinserção social e o projeto de vida com os familiares e a mãe de uma das primeiras internas não só participa como trabalha como cozinheira. A menina veio de Santa Cruz do Rio Pardo e hoje a familia está integrada ao hospital.


O tempo de internação depende do quanto o adolescente se interessa pelo programa. A participação, o foco e o aproveitamento são fundamentais. O programa foi escrito para o adolescente permanecer internado seis meses, porém, muitos querem sair antes e alguns os pais retiram.

“Os pais podem interromper o tratamento desde que tenham sido eles os responsáveis pela internação. Quando o juiz encaminha não há essa possibilidade sem a sua autorização ou alta da equipe.”

E a dificuldade continua após liberação. Muitos adolescentes saem com encaminhamento a outro serviço de saúde porém não dão continuidade ao atendimento, raramente a família dá o suporte necessário.

“Outra dificuldade encontrada é encontrar profissionais em numero suficiente para dar acompanhamento pós alta. São poucos projetos sociais. Tento sempre buscar alternativas para o adolescente que sai, mas é difícil porque atendemos 62 municípios.”

A equipe conta com clinico,  psiquiatra,  psicólogas,  terapeuta ocupacional,  assistente social, farmacêutica, nutricionista, pedagogas, professor de judô, enfermagem e  técnicos de enfermagem.

“Buscamos trazer toda família para o tratamento e também é uma dificuldade. Alguns não têm interesse, outros têm interesse e não tem condições financeiras de participarem dependendo assim do município liberar condução.”