A juíza Angela Martinez Heinrich, da 5ª Vara Cível de Marília, atendeu a um pedido de despejo protocolado por Elza Arquer contra a CMN (Central Marília Notícias) e determinou a devolução do imóvel de número 55, da rua Coronel Galdino de Almeida, onde o jornal Diário e as rádios Diário FM e Dirceu AM funcionaram por mais de duas décadas.
A justiça emitiu mandado de imissão na posse que autoriza a entrega do imóvel, com arrombamento se for necessário, mas cria um novo problema: o acervo de móveis, documentos, equipamentos e mesmo da história dos veículos deixadas no prédio.
“Estando livre de pessoas, proceda a imissão na posse da autora, lavrando-se o respectivo auto e cuidando a requerente de fornecer os meios necessários ao cumprimento da medida, salientando que eventuais bens existentes no imóvel deverão ficar sob a guarda e responsabilidade da locadora, nomeando-a depositária. Poderá a autora, às suas expensas, providenciar a entrega dos eventuais bens aos requeridos”, define a decisão da Justiça.
Mas assim como em todas as ações judiciais envolvendo a CMN, a dúvida é a mesma: quem é o dono que vai querer receber todo o material? Um previsível impasse entre a dona do prédio e os supostos donos da CMN pode levar até ao descarte e perda de todo o acervo, documentos, e equipamentos.
A ação de despejo foi protocolada em dezembro de 2016, quando as rádios já estavam fechadas pela Anatel como consequência das investigações da Operação Miragem, e a CMN acumulava meses de atraso nos pagamentos.
Em janeiro de 2017 o jornal Diário foi fechado. As atividades comerciais foram encerradas e o prédio ficou abandonado com móveis, equipamentos, documentos fiscais e trabalhistas. A ação despejo provocou até consultas da Justiça Estadual à Polícia Federal e ao TRF3 – Tribunal Regional Federal, em São Paulo- sobre a possibilidade de transferência do imóvel.
“Estando o imóvel fechado e sem uso, com débitos locatícios pendentes, pelo que se observa dos documentos juntados, a lacração efetivada pela Polícia Federal não pode restringir o direito de propriedade da autora. Ademais, a requerente não está sendo investigada pela Polícia Federal e não faz parte da ação em curso pelo TRF-3, sendo que eventuais investigações relacionadas ao imóvel que interessavam ao inquérito já foram concretizadas”, diz a juíza em seu despacho.
HISTÓRIA
O prédio de três andares no coração da cidade abrigava na década de 80 uma loja da rede de ópticas Iguatemy, do empresário Juan Arquer Rubio. A partir de 1986, ele transferiu para o prédio as atividades de um jornal com duas edições por semana, o Marília News, que depois seria transformado no jornal Diário.
Agregou ao grupo as rádios Tangará FM – que foi transformada em Diário FM – e Dirceu AM – que foi transformada em rádio Cidade, mas depois voltou a usar o nome mais tradicional. O empresário também comprou a assumiu controle do jornal Correio de Marília, fundado em 1º de maio de 1928, antes de a cidade ser emancipada politicamente. O Correio acabou absorvido pelo Diário.
COm isso, o predio arquiva exemplares e documentos das duas empresas, além de acervo de fotos, gravações e outros materiais das rádios. Também abrioga documentos contábeis, trabalhistas e de administração das empresas. No térreo, tem um parque gráfico com uma impressora comprada em 1990 e que na época revolucionou padrão de jornais impressos na cidade.
Em dezembro de 1994, Arquer Rubio vendeu o jornal e rádios, transferidos inicialmente ao empresário Antonio Marangão, de Garça, e alguns anos depois ao bancário Carlos Francisco Cardoso.
Em final de 2011 rádios e jornais foram vendidos a dois sócios: Sandra Mara Norbiato e Marcel Certain, todos moradores de outras cidades, que acabaram apontados como laranjas dos verdadeiros donos.
A suspeita levou a uma investigação da Polícia Federal e à Operação Miragem, que em agosto de 2016 interditou as rádios. Em outubro de 2016, Sandra Norbiato fez um acordo de delação premiada e disse ser laranja do deputado estadual Abelardo Camarinha e o seu filho, o ex-prefeito Vinícius Camarinha, acusados de serem os verdadeiros donos das empresas.
Em janeiro de 2017 uma nova etapa da operação que aproveitou denúncia de ameaças contra Sandra Norbiato, fechou o jornal. Em maio daquele ano virou denúncia criminal contra dez acusados, incluindo o deputado e o ex-prefeito. O fechamento das empresas provocou ainda uma onda de ações trabalhistas, com dezenas de processos.