O Ministério Público Federal entrou com recurso para que seja recebida integralmente a denúncia contra um homem que se passava por escrivão da Polícia Federal para obter vantagens pessoais em Marília .
O denunciado foi preso em flagrante em janeiro deste ano com um falso crachá de servidor da PF pendurado no pescoço. Ele também levava documentos adulterados, relacionados à Operação Lava Jato de Curitiba (PR), como um pedido de prisão preventiva assinado pelo ex-juiz Sérgio Moro.
O MPF pede ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) que a ação penal seja instaurada e julgada pela Justiça Federal, após decisão proferida em primeira instância rejeitar parte da denúncia e remeter uma das imputações à Justiça Estadual.
O falsário utilizava a identidade ilegítima para conseguir favores em estabelecimentos comerciais de Marília, tais quais amostras grátis de protetores solares importados e a realização de test drive em carros de alto valor.
O MPF denunciou o preso por falsificar o escudo do Departamento de Polícia Federal, símbolo identificador de órgão da administração pública, falsificação de documento público (art. 297), falsa identidade (art. 307) e furto qualificado pela fraude, conforme o art.155, § 4º, II, todos do Código Penal. O réu segue detido na Penitenciária Estadual de Marília.
A decisão em primeira instância rejeitou parte da denúncia, afirmando que a falsificação do escudo da PF não teria relevância para efeitos penais, visto que “não ultrapassou dos limites de mera mentira”.
Segundo a sentença, “não há que se falar em crime” quando “o documento falso empregado com o intuito de ludibriar a fé pública é sujeito à conferência e seus vícios são identificados”.
Em seu recurso, o MPF questiona tal entendimento, já que, dessa forma, ninguém mais seria punido por crimes de falsidade no Brasil. “Ou o documento falso seria ‘idôneo’, perfeito, e o crime jamais identificado, ou sua descoberta seria suficiente para demonstrar a inidoneidade do documento e, como consequência, a inexistência de crime”, destaca.
O MPF também recorreu para que a imputação por furto qualificado não seja remetida à Justiça Estadual. Em sua argumentação, a Procuradoria ressalta que há conexão entre o crime federal (uso indevido de símbolo identificador da PF) e a subtração das chaves dos veículos, situação que determina a prevalência da competência da Justiça Federal.
CRIMES
Segundo o depoimento de vendedores que atenderam o acusado dias antes da prisão, o homem se apresentava como policial federal e portava ostensivamente o documento de identificação da instituição, sempre solicitando favores e regalias.
Em uma concessionária, o denunciado fez um test drive após informar que pretendia comprar um veículo de alto valor. Ele também pediu para utilizar um computador do estabelecimento para “imprimir um mandado de prisão”.
Em outra loja de revenda de carros, o farsante alegou que estava trabalhando em uma “operação” da PF e que necessitava comprar um veículo. Apesar da insistência para realizar um test drive, o proprietário do estabelecimento não autorizou a condução do automóvel pretendido pelo denunciado.
Após a saída dele, contudo, foi constatado o sumiço de três chaves de carros, as quais foram encontradas em poder do falsário no dia de sua prisão em flagrante. O furto causou prejuízo de R$ 2,8 mil ao dono da loja, referente ao serviço de produção das chaves reservas.
“Para a consumação do crime de furto, foi elemento indispensável a fraude consistente no uso indevido do emblema da Polícia Federal no crachá portado pelo denunciado e a atribuição de falsa identidade, autointitulando-se pessoa possuidora do cargo escrivão da Polícia Federal, situação que certamente causou certo grau de temor reverencial sobre o proprietário do estabelecimento, atuando como elemento de distração e facilitador da subtração, e que justificou, inclusive, o fato de o denunciado ter passado quase uma hora dentro da loja”, observou o MPF na denúncia.
A vendedora de uma farmácia afirmou que ele já havia comparecido anteriormente ao local apresentando-se como médico e fornecendo inclusive o número de CRM, que posteriormente verificou-se pertencer a profissional já falecido.
Dessa vez, ao se passar por policial, o falsário pediu que lhe fossem entregues amostras de protetores solares importados. Em outras lojas de produtos de beleza, ele solicitou às vendedoras a doação de frascos vazios, sob o pretexto de que armazenaria produto medicinal usado por sua mãe.
Essas não foram as únicas ocasiões em que o denunciado utilizou dados de outra pessoa. Em janeiro de 2016, ele foi flagrado por policiais militares quando tentava se passar por perito judicial em um supermercado de Marília.
Ostentando no pescoço uma falsa carteira funcional, o homem informara aos funcionários que queria vistoriar o estabelecimento. Por esse caso, ele responde a processo movido pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, por falsificação e uso de documento particular falso, o qual tramita na Justiça Estadual em Marília.
Documentos
No dia de sua prisão em flagrante, o denunciado portava, além do falso crachá, uma pasta com características de originalidade da Justiça Federal da 3ª Região, contendo diversos documentos relacionados à Operação Lava Jato de Curitiba.
Além de trechos de inquérito policial e planilhas disponíveis na internet, as impressões englobavam falsificações, feitas a partir de diversos atos policiais e judiciais legítimos. As montagens, que incluíam pedidos de prisão preventiva e de busca e apreensão, foram feitas para adicionar o nome do suposto escrivão com o da autoridade policial que teria participado da lavratura dos atos.