Não importa seu voto, partido político, corrente ideológica, corrente filosófica, crenças religiosas.
Desconheço seus amores, suas paixões, histórias passadas, dores, angústias, o que te tira o sono, ou o que alimenta sua alma.
Muito menos seus cheiros preferidos, os pratos favoritos, lugares que te elevam e as viagens inesquecíveis.
Não se comemora morte. Em que hipótese? Nenhuma!
A morte é a cessação da esperança, e como diz a famosa frase, nada mais triste que a morte de uma ilusão, esperança é uma ilusão, mas é uma ilusão que precisa ficar viva.
Enquanto há vida, há esperança, meu povo, isso é verídico até o final.
Há esperança de mudança, recomeços, novas histórias contadas, novos desfechos, há possibilidade do porvir.
Mas você está defendendo bandido, o direito dos “mano”?
Não, estou defendendo o Direito do ser humano, o direito inalienável à vida.
Estamos num momento conturbado onde quase todos ganharam uma toga e pior, muitas vezes, justiceiros sociais. Perpetuamos um linchamento virtual idiota ao menor sinal de discordância de nossas ideias, que nós, pretensamente, consideramos melhores, mais inteligentes e mais bem elaboradas do que a da outra criatura que, muitas vezes, conhece muito mais que nós quando damos nossa “preciosa” opinião.
Já parou para pensar que nem tudo que você diz é tão interessante assim? Que sua opinião não é importante como você julga ser?
E qual a necessidade de termos uma opinião formada sobre tudo, aquela velha opinião formada sobre tudo como já cantava Raul?
Estamos perdidos, ok, pode parecer pessimismo e talvez seja. Não me refiro a questões políticas que tem tirado o sono de muita gente, inclusive da moça que está digitando desse lado de cá da tela, mas como seres humanos, fugindo de nós mesmos e para isso temos apontado o dedo para todos que não são espelhos.
Comentando com um grupo de amigos sobre a questão da problematização em todos os sentidos, uma amiga brincando ainda perguntou se eu gostaria de monopolizar a problematização.
Pelo contrário, queria que evitássemos um pouco as problematizações, antigamente, os cientistas sociais eram os detentores da alcunha.
Bastava apontar um cientista social na esquina, havia troca de olhares e a tentativa de elaborar uma desculpa para uma saída da mesa, fosse ela à francesa ou não.
Cientista social é um chato de galocha, discute sobre tudo, qualquer assunto vira motivo de questionamento, diziam eles.
Hoje, eles, somos nós. Todos nós. Argumentadores inveterados, filosófos de facebook, historiadores da Wikipedia, cientistas sociais formados por Fake News ou por mídias tendenciosas.
Nem toda postagem precisa virar um problema, nem todo ponto de vista, pessoas podem pensar diferente de você e, talvez, o que pensa e defende pode ser mais interessante ou ter mais embasamento do que o que você defende.
Não se comemora morte.
Esse é um valor independente de argumentação teórica-filosófica que você venha defender, das suas graduações, pós-graduações, se é Phd. em qualquer área. Não se defende morte.
Essa semana, mais uma vez, vestimos a toga e vimos através da televisão um homem ser assassinado.
Não, você viu errado, foram 37 vidas salvas. Pois bem, teriam que ser 38 vidas salvas. O rapaz que morreu deveria cumprir prisão e ser julgado por seus atos.
Ah, mas ele mataria os passageiros do ônibus, foi necessário que o sniper o matasse. Mas não se comemora morte.
Havia do outro lado uma mãe pranteando a vida do filho, um pai chorando sua perda. Pessoas que criaram um filho e tinham esperança, torceram, o criaram para ser feliz.
A mãe chorou e foi consolada por um pai de uma das vítimas, não se comemora morte.
Não se comemora morte de idoso, de mulher, de homem negro, branco, de pastor, de pai de santo, de policial, de um bandido. Não se comemora morte.
As políticas de segurança e nossa constituição precisam garantir que aqueles que cometem crimes paguem por eles, mas não com a vida. Causa e consequência.
Não estamos no tribunal da Rainha de Alice no país das Maravilhas onde a mesma mandava cortar a cabeça de qualquer um que se opusesse a ela.
Não se comemora morte!
Atrás de todo ser humano assassinado há uma família, um projeto de vida, há sonhos, esperança. Há também o desespero, a tristeza, o desassossego.
Cada corpo tombado leva mais do que vísceras e sangue, às vezes leva um Bukowski, uma depressão silenciada, as mãos sofridas de um padeiro.
Às vezes leva crimes, mortes, estupros, marginalização, abandono.
Às vezes não leva nada.
Não se comemora morte!