Mulher

A mulher que carrega palavras.

A mulher que carrega palavras.

Tem um poema da Marina Colasanti chamado Eu sei, mas não devia.

A primeira vez que ouvi esse poema estava na sétima série e minha professora na época, acho que Marlene, leu em voz alta para a sala inteira.

Não tinha vivido metade das coisas que vivi, nem entrado no mercado de trabalho, nem me apaixonado pela primeira vez.

No entanto, ao ouvir o poema, lá no início de minha adolescência, me senti contemplada.

Recordo o poema porque ele me faz lembrar dos meus silêncios que nunca deveriam ter se transformado nessa ausência de linguagem.

O silêncio que ora me foi imposto e que, em outros tantos, usei como escolha. Não porque fosse melhor, mas para evitar conflitos ou por vergonha de me expor.

Sabemos um monte de coisa, não é? Mas, muitas vezes, era melhor que não soubéssemos.

Para que saber se me escondo ou me eximo do pronunciamento?

Se fosse tudo tão racional e lógico. Tem silêncio que chumba as palavras, as enterra em caixão bem lacrado e, às vezes, com muito custo sai uma lágrima na tentativa de libertar uma delas.

A dor enterra palavras.

Há dores que não podem ser verbalizadas.

Nenhuma palavra no mundo dá conta de tantas dores e sofrimento.

O silêncio, muitas vezes, não é pela ausência do que dizer, mas pelo excesso de palavras que formam uma miscelânea tão grande que se torna impronunciável.

A dor é impronunciável assim como é incomensurável. Algumas pessoas se encerram lá nesse país das bocas mudas e morrem engasgadas.

Não é difícil. Quando você tenta a todo custo comunicar o que sente e não encontra um coração aberto e ouvidos atentos.

Vamos silenciando as alegrias, as tristezas, as dores, os amores.

Contamos nossos segredos às plantas, aos animais de estimação ou jogamos ao ar quando estamos sozinhos e dialogamos com deus(?), com o universo, com algum ser espiritual ou conosco mesmo na tentativa de falar e ser ouvido ou entendido.

O silêncio imposto é violência, por escolha, é liberdade, o que nos sentencia a solidão é morte.

De uns dias para cá ando carregada de palavras, desconfio até que as dores nas costas e quadris seja pelo peso de carregar tanto a ser dito.

Entrei em trabalho de parto algumas vezes, considerei que fosse parí-las.

Só dores e mais dores, nenhum rebento apareceu.
Nenhuma dor foi extirpada, nenhum silêncio foi quebrado.

Sigo quebrada e pesada, carregadora de silêncios e sufocada de palavras.