Saúde

"Brasil já está na 2ª onda de Covid-19", diz pesquisador da USP

"Brasil já está na 2ª onda de Covid-19", diz pesquisador da USP
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BBC News Brasil

“O Brasil já está na segunda onda de covid-19 .”

O alerta vem do pesquisador Domingos Alves, responsável pelo Laboratório de Inteligência em Saúde (LIS) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo ( USP ), em Ribeirão Preto.

Alves vem acompanhando há oito meses os dados da pandemia brasileira como um dos responsáveis pelo portal Covid-19 Brasil , que reúne dezenas de especialistas de diferentes áreas em torno da produção de estatísticas e análises da propagação do novo coronavírus no país.

Sua avaliação de que o Brasil está vivendo, assim como os  Estados Unidos e a Europa , uma nova onda de contágios se baseia na evolução da taxa de reprodução (Rt) do coronavírus no país, que indica que a pandemia voltou a crescer por aqui.

Essa taxa é calculada com base no aumento de novos casos e permite saber quantas pessoas são contaminadas por alguém que já está infectado .

Se o índice fica acima de 1 , isso indica que a pandemia está se expandindo. Quando está abaixo, é um sinal de que a pandemia está perdendo intensidade.

No caso do Brasil, a taxa era de 1,12 em 16 de novembro, de acordo com o Observatório de Síndromes Respiratórias da Universidade Federal da Paraíba .

Isso significa que 100 pessoas irão infectar outras 112, que, por sua vez, irão infectar outras 125. Assim, a epidemia brasileira cresce exponencialmente.

Na mesma data, a Rt estava acima de 1 em 20 Estados (Acre, Alagoas, Amapá, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Minas Gerais, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rondônia, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe e Tocantins) e no Distrito Federal.

A situação estava mais crítica no Paraná, onde a taxa era de 1,62. Já em Santa Catarina a Rt está acima de 1 há mais tempo: desde 14 de outubro.

Gráfico sobre a taxa de reprodução do coronavírus no Brasil
UFPB
Média da taxa de reprodução do coronavírus voltou a ficar acima de 1 em 11 de novembro, após três meses abaixo deste patamar

Alves também analisou a média móvel da Rt, que é calculada com base nos 14 dias anteriores.

“É importante a gente olhar a média móvel porque isso indica que não se trata apenas de uma flutuação do índice, mas que há uma tendência concreta de alta ou queda”, diz o pesquisador.

Neste caso, em 16 de novembro, o valor no Brasil era de 1,06. Na mesma data, a média móvel da Rt estava acima de 1 em 16 Estados (Acre, Alagoas, Amapá, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Rondônia, Santa Catarina e São Paulo).

De novo, o maior índice era o do Paraná (1,34), mas o do Acre (1,32) estava quase tão alto quanto.

O Espírito Santo era o Estado onde a média móvel da Rt estava acima de 1 há mais tempo, desde 20 de setembro. Mas Santa Catarina também se destacava, com uma média móvel de Rt acima de 1 desde 8 de outubro.

Média de novos casos também voltou a crescer

A média móvel da Rt do Brasil está acima de 1 desde o dia 11 de novembro. Ou seja, há quase uma semana. O índice não ultrapassava esse patamar desde o dia 10 de agosto.

Em outras palavras, depois de três meses de contração, a  pandemia voltou a crescer no país, caracterizando a segunda onda identificada por Alves.

Isso se reflete claramente no monitoramento da média móvel de novos casos registrados no país feito pelo Covid-19 Brasil .

Essa taxa vinha apresentando uma tendência de queda desde meados de agosto e atingiu seu menor valor desde então em 6 de novembro, com 13.644 de novos casos.

Então, voltou a subir. Em 16 de novembro, a média móvel ficou em 28.425 novos casos, um aumento de 208% em questão de dez dias.

Gráfico sobre a média de novos casos de covid-19 no Brasil
Reprodução
Média de novos casos voltou a crescer em 6 de novembro e dobrou em 10 dias

É a mesma situação enfrentada por Estados Unidos e Europa, onde a propagação do coronavírus voltou a se intensificar nas últimas semanas.

“Nossa segunda onda vai ser mais parecida com a dos EUA do que com a da Europa, porque a Europa conseguiu controlar de verdade a transmissão, que voltou com força depois do verão, quando as pessoas foram viajar e trouxeram novas cepas do vírus para casa”, afirma Alves.

Já nos EUA e no Brasil, não houve um real controle da pandemia, na avaliação do pesquisador, o que gerou quase uma sobreposição entre as ondas de contágio .

“Nunca conseguimos controlar a transmissão comunitária “, diz o cientista da USP, em referência ao estágio de uma epidemia em que um vírus circula livremente entre a população.

Nesta semana, o  presidente Jair Bolsonaro (sem partido) comentou sobre a possibilidade de o país enfrentar uma segunda onda de contágios.

“E agora tem a conversinha de segunda onda . Tem que enfrentar se tiver (segunda onda). Se quebrar de vez a economia, seremos um país de miseráveis”, disse ele na sexta-feira (13/11) ao deixar o Palácio da Alvorada.

Subnotificação pode ocultar realidade ainda mais grave

Profissional de saúde faz teste de covid-19 em menino
Reuters
Só se houver testagem em massa poderá se evitar fechar tudo de novo, diz cientista da USP

Domingos Alves diz que a situação na realidade pode ser ainda mais grave do que o que mostram os dados oficiais .

“Desde meados de setembro, o problema da subnotificação vem se agravando, porque estão sendo feitos menos testes, e, entre os que são realizados, são cada vez menos os de PCR, que são mais precisos, e mais testes rápidos, que dão muito falso negativo (exames que falham em constatar que a pessoa está contaminada)”, afirma o pesquisador.

Alves afirma que esses números devem se traduzir em um maior número de internações , como já vem ocorrendo em São Paulo.

“É de se esperar um aumento significativo nestes Estados nas próximas duas semanas”, afirma ele. “A tendência é o quadro piorar muito.”

Tudo dependerá de como as autoridades brasileiras vão lidar com a nova leva de casos que já começam se refletir nas estatísticas.

“Quando veio a primeira onda , o cenário era o mesmo: os casos estavam se multiplicando na Europa e nos EUA e sabíamos que ia chegar aqui, mas ficamos enxugando gelo, não tomamos as medidas adequadas e tivemos que fechar tudo”, afirma o cientista.

“De novo, sabemos o que vai acontecer com a gente ao ver os EUA e a Europa. Não é uma questão de se, é uma questão de quando.”

Agora, diz Alves, o país já tem uma experiência acumulada sobre como lidar com a pandemia e exemplos de o que funciona melhor para conter a disseminação do coronavírus.

Ele defende a testagem em massa e o rastreamento das pessoas com quem os infectados entraram em contato para isolar todas para quebrar a cadeia de transmissão.

“Só assim vamos conseguir reverter essa segunda onda e não ter que fechar tudo de novo”.

Fonte: IG SAÚDE