A MP que abre caminho para a privatização da Eletrobras se tornou uma coleção de “jabutis” , como são chamadas mudanças feitas no texto que não têm relação direta com sua finalidade. As alterações foram a forma que o relator no Senado , Marcos Rogério (DEM-RO), encontrou para atender a senadores da base do governo , numa tentativa de garantir a aprovação da MP.
A privatização da Eletrobras é um anseio do ministro da Economia Paulo Guedes , que até hoje não conseguiu vender uma estatal de peso desde que assumiu o cargo, e vem sendo defendida até pelo presidente Jair Bolsonaro.
Entre os jabutis estão reservas de mercado como a contratação de térmicas a gás natural, pequenas centrais hidrelétricas e até incentivos a energia a carvão. Este último item foi incluído pelo relator no Senado.
Nesta quinta-feira, Rogério atendeu o pedido do governo e retirou do relatório apresentado na véspera a exigência de contratação das termelétricas movidas a gás antes da privatização da Eletrobras. As usinas ainda terão de ser contratadas, mas isso deixa de ser uma condição para a venda da estatal.
Veja os jabutis que foram incluídos no texto
Contratação de termelétricas
O texto aprovado pela Câmara prevê a contratação de 6 mil megawatts (MW) de energia térmica a gás natural e estipulava as regiões onde seriam erguidas as termelétricas: Nordeste, Norte e Centro-Oeste. O relatório amplia as exigências, ao prever locais específicos para a construção das usinas em redutos eleitorais de senadores.
Serão 1.000 MW na região Nordeste, 2.000 MW no Norte onde seja viável a utilização das reservas provadas de gás natural nacional existentes na Amazônia e 2.000 MW no Centro-Oeste. Nos três casos, será necessário instalar as térmicas onde não há suprimento de gás, o que obrigará a construção de extensos gasodutos.
Também será necessário construir 1.000 MW na região Sudeste, sendo 50% para estados produtores de gás natural e 50% para estados não produtores de gás.
Entidades do setor elétrico se manifestaram contra a obrigação, com o argumento de possíveis impactos nas tarifas. A situação gerou um impasse até entre senadores pró-privatização.
Incentivo para o carvão
O texto estede até 2035 incentivos para a geração de termelétricas a carvão, o que beneficia principalmente o Rio Grande do Sul. Se aprovado como está, a decisão colocará o Brasil na contramão da tendência mundiall. Países que historicamente usavam esse combustível, têm abandonado o carvão.
Pequenas centrais hidrelétricas (PCHs)
A MP prevê mais uma reserva de mercado. Determina ainda a contratação de 2 mil MW de energia de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), em qualquer região do país, o que também tem gerado críticas. O governo defende a contratação das PCHs. Mas as discussões sobre o assunto geraram resistências no Senado.
Mudanças no ONS
O relatório muda a forma da nomeação da diretoriado Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Agora, os nomes terão que passar pelo crivo do Senado. Para integrantes do governo, isso pode levar a indicações políticas no órgão que que comanda a operação do setor elétrico.
Barragens e Lago de Furnas
O relator exige que o Executivo elabore um plano para viabilizar a recuperaçãode reservatórios de hidrelétricas, o que atende a demanda do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), sobre o Lago de Furnas, em Minas Gerais, base eleitoral do senador.
Uma das medidas tomadas pelo governo contra a crise hídrica foi a determinação para reduzir o uso da água dos reservatórios para fins que não sejam a geração de energia. Uma das barragens afetadas é o Lago de Furnas, muito usado para o turismo. Pacheco quer que a gestão das águas permita a exploração turística.
Indenização ao Piauí
O relator incluiu no texto uma forma de garantir o fornecimento de energia mais barata para a indústria da Região Norte e uma indenização de R$ 260,4 milhões ao governo do Piauí pela privatização da sua distribuidora de energia. O valor será pago pela Eletrobras.
Mercado livre
O texto também prevê que, a partir de julho de 2026, todos os consumidores poderão optar pela compra de energia elétrica de qualquer concessionário, permissionário ou autorizado. Na prática, todo consumidor poderá se tornar consumidor livre, comprando energia de quem desejar. Hoje, os consumidores residenciais, por exemplo, estão no chamado mercado cativo, com contratos de longo prazo firmados entre distribuidoras e geradoras de energia.