Economia

Com auxílio emergencial insuficiente, mercado solidário luta contra a fome

Com auxílio emergencial insuficiente, mercado solidário luta contra a fome


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Criado em Tatuí pela Igreja Batista da Lagoinha , o mercado solidário Casa do Pão tem se mostrado uma saída contra a fome na cidade do interior de São Paulo . A crise econômica provocada pela pandemia de coronavírus fez as famílias se reinventarem para não conviverem com a fome . No local comunitário de compras, as famílias em insegurança alimentar podem passar no mercado e pegar os alimentos que precisam, minimizando a defasagem do valor do auxílio emergencial, considerado insuficiente para garantir renda aos brasileiros mais necessitados.

Para ter acesso às compras, os organizadores realizam um cadastramento. Em seguida, há uma seleção das famílias baseada em urgências após análise de vulnerabilidade . A pontuação em crédito mensal permite fazer as compras, gratuitamente, de alimentos, de produtos de higiene e de limpeza. Cada beneficiário pode fazer compras por três meses, tendo a possibilidade de renovação do período por mais três. 

Segundo Asafe Rafael Villalpando, organizador da iniciativa, a ideia surgiu porque o aumento do desemprego e da fome fizeram com que o jovem, junto de outras pessoas e da igreja, buscassem uma maneira de ajudar a quem precisa. “A gente sabe que o auxílio emergencial não está servindo para dar conta de despesas de uma casa, ainda mais agora com a redução dos valores”, afirma.

Numa tentativa de minimizar os impactos do fechamento de postos de trabalho, que fez cair a renda da população, o governo federal lançou o benefício em abril do ano passado. Na primeira fase, o valor pago para a média de brasileiros que solicitaram foi de R$ 600, que passou para R$ 300 e hoje está em R$ 250, e ainda há quem receba R$ 150. Para Asafe, esta redução impactou a alimentação das pessoas, aumentando o número de famílias cadastradas.

“A procura foi tão grande que hoje são 200 famílias cadastradas, ou seja, uma demanda além da oferta.”

Célia Aparecida Delfino Alves, 49, é uma das atendidas pelo projeto Casa do Pão. Ela tira o pouco da renda que ganha como lavadora de roupa. Desde o início da pandemia, sentiu uma diminuição no número de clientes e hoje só consegue obter R$ 200 por mês pelas lavagens.

Como muitos brasileiros, a trabalhadora passou por períodos de insegurança alimentar . O marido era quem sustentava a casa com boa parte das contas trabalhando com cerâmica. No entanto, após um AVC (Acidente Vascular Cerebral), ele não pôde mais trabalhar e a renda da família caiu consideravelmente, segundo ela. O marido aguarda retorno do Instituto Nacional de Seguridade Social ( INSS ) sobre um benefício em decorrência da doença. 

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Além do valor que recebe da lavagem das roupas, Célia é beneficiária do Bolsa Família e, atualmente, está ganhando o auxílio emergencial no valor de R$ 375. “O dinheiro vai para conta de água e luz. Eu não tenho nada na minha casa que puxe luz, mas a conta vem R$ 200”, lamenta. 

A lavadora de roupa vai para o segundo mês de compras no mercado solidário na próxima terça-feira (29) e o único sentimento diante da dificuldade financeira e alimentar é de agradecimento. “Eles ajudam muito. Foi a melhor coisa que fizeram por mim e pelas outras pessoas. São muito abençoados por Deus”, diz. 

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil tem hoje 14,8 milhões de pessoas desempregadas, o que significa uma taxa de desemprego de 14,7% no primeiro trimestre deste ano. 

A pandemia acentuou ainda mais o contexto de insegurança alimentar. É o que mostra o Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, realizado pela Rede Brasileira em Soberania e Segurança Alimentar (Rede Penssan). De acordo com os números, estima-se que mais da metade dos lares brasileiros, o que corresponde a 116 milhões de pessoas (55,2%), teve algum grau de insegurança na alimentação e cerca de 9% passaram fome desde o início da pandemia até o fim do ano passado. 

Na Casa do Pão, os alimentos são doados por empresas e pessoas físicas. Porém, a ideia é criar, a partir de julho, uma associação, a fim de tentar obter mais recursos para compra de alimentos e ampliar o atendimento. “Com as doações, queremos dar às empresas a possibilidade de descontar no imposto [como um incentivo à doação]”, ressalta o organizador.

“Se todos nós tivéssemos a consciência de dividir, dentro desse contexto de desemprego, de fome, poderíamos avançar nessa questão”, finaliza Asafe.