Guarda-roupas.

Às vezes é  preciso arrumar o guarda-roupa, as gavetas, tirar as roupas que, embora boas, não  servem mais.

Não  servem só  no sentido de “engordei” ou “emagreci”.

 Mas não  condizem com o que somos agora, o que pensamos e quem nos tornamos.

As gavetas abarrotadas de papéis que já  não  lembramos para o que servem.

Tudo aquilo que queremos esconder, tem sempre uma gaveta para isso.

Quando começamos a tirar as roupas para organizar percebemos que temos mais roupas do que imaginamos.

Que muitas delas esquecemos da existência e que já  não  nos identificamos mais como anteriormente.

Nas gavetas quase tudo, em alguns casos, tudo, não  tem mais serventia.

 Só  está  ocupando um espaço há  muito esquecido por nós.

A vida se assemelha a um  guarda-roupa imenso e suas gavetas cheias de entulhos inteiramente dispensáveis.

Teimamos em guardar, num apego bobo, o máximo  de coisas  que consideramos importantes e que deixou de ser útil há muito tempo.

 Precisamos, frequentemente, renunciar a convicções,  crenças,  pessoas, para seguir adiante.

Não  significa ter uma atitude utilitária com as pessoas e usá-las como meros objetos.

Contudo, aceitar que elas mudam, nós mudamos.

  Não  faz sentido manter alguém  que   não  condiz com  as transformações  que a vida causou a ambos.

Conhecidos que se tornaram estranhos.

É  preciso aprender a deixar ir embora.

Se pesa, causa desconforto,  adoece, está  na hora de abdicar,  deixar escorrer entre os dedos.

Não  perdemos pessoas, perdemos objetos, uma mala, um brinco,  uma aliança,  Deus nos livre dessa última.

Pessoas escolhem ficar ou ir embora, tem gente que foi faz tempo e continua em nossas vidas.

Por obrigação moral, pelos anos de relacionamento,  pela amizade.

Nada disso morre com a separação.

As histórias que construímos ao nos relacionarmos não  acabam com os términos  das relações.

Elas permanecem em nós  para o bem ou para o mal.

 Levamos as pessoas conosco. Completamente? Não, os fragmentos.

Quando decidimos que uma pessoa não  fará mais parte de nossa vida, não  estamos dizendo adeus ao que ela foi, mas abandonamos o que ela é. 

Tal qual uma roupa que continua bonita, em bom estado de uso, mas que não  nos serve ou não  gostamos mais.

Por vezes é  necessário faxinar nossos guarda- roupas internos.

 Abrir gavetas, deixar o ar entrar, o cheiro de mofo sair, colocar para lavar as roupas de frio com cheiro de guardadas.

Abandonar ideias ultrapassadas, amizades perdidas, amores vazios.

Doar roupas, libertar pessoas.

Guarda-roupas muito cheios, não  cabem roupas novas.

Os finais chegam, as partidas são inevitáveis. 

E é  mais que necessário saber o que nos cabe, isso vale para roupas e para pessoas.