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'Não sentia nem coceguinha': elas contam como se descobriram assexuais

Pexels/Ron Lach A assexualidade é uma orientação sexual e não significa não gostar de sexo; entenda o termo
Pexels/Ron Lach A assexualidade é uma orientação sexual e não significa não gostar de sexo; entenda o termo


Desde que começou a ser usada como nomenclatura oficial em 2008, a sigla LGBT passou por mudanças e ganhou novas variações para que se tornasse mais inclusiva. Uma delas foi a adição da letra “A” para se referir às pessoas “assexuais” . De modo geral, uma pessoa assexual sente pouca ou nenhuma atração sexual por outras pessoas. Ou ainda, sente atração sexual mas dentro de determinada condição ou circunstância.

“Ser assexual não significa que essa pessoa não transa, não significa que ela não tem tesão, não significa que ela não se excita… Mas é mais difícil ela ter esse ímpeto de buscar alguma coisa. Os assexuais costumam brincar: ‘Eu prefiro comer um bolo gostoso [do que transar]’, ‘Eu sinto mais prazer fazendo outra coisa'”, comenta a terapeuta sexual Dani Fontinele.

Dessa forma, qualquer pessoa que não se identifique como parte da comunidade assexual é chamado de “alossexual”. O prefixo “alo” deriva do grego antigo “állos”, que significa “outro”. O que diferencia os assexuais e os alossexuais não é a prática sexual, mas sim a forma como cada grupo sente atração.

Apesar de o termo ter se tornado mais conhecido recentemente, os assexuais sempre fizeram parte dos grupos de diversidade sexual. Podemos dizer que a assexualidade é um espectro, ou em outra palavras, um termo “guarda-chuva”, que abriga outras formas de identificação. Segundo o Coletivo Abrace, formado por pessoas assexuais, são elas:

  • Assexual estrito: que não sente nenhuma atração sexual;
  • Demissexual: que pode sentir atração sexual por outra pessoa desde que haja um vínculo afetivo;
  • Grayssexual: que a atração sexual pode existir de forma rara ou em situações específicas;
  • Assexual Fluido: que transita pelas outras identidades ocasionalmente, ou seja, ora pode se sentir como assexual estrito, ora demissexual ou grayssexual.

“A assexualidade é uma orientação sexual e, assim como as outras, ela é autodeclarada. Ninguém pode chegar na pessoa e falar que ela é assexual. Por exemplo, um homem não pode chegar para a mulher e falar: ‘Toda hora eu quero transar com você e você nunca quer, você é assexual!'”, pontua a sexóloga.

Ser assexual não é não gostar de sexo

“Quando alguém simplesmente fala ‘Não gosto de sexo’, normalmente é ‘Não gosto da sensação’, ‘Não achei legal’, ‘Não é do meu interesse’. Mas quando a gente se coloca como assexual, vai muito além de gostar ou não de fazer alguma coisa. A gente parte do princípio da atração, é aí que está a diferença. Eu posso não gostar, mas se eu sinto atração por uma pessoa, isso não me faz assexual”, diz a designer gráfico Alicia Camelo, de 23 anos. Ao iG , ela conta que se identifica como assexual estrita há cerca de três anos.

“Eu pensava: ‘Nossa, eu nunca fiz nada… Olha os meus amigos, fizeram várias coisas. Mas eu também não tenho interesse em procurar uma pessoa para fazer alguma coisa…'”, comenta. “Antes de eu me descobrir, as pessoas já falavam sobre demissexualidade, e aí eu lembrei desse termo e fui pesquisar”. Alicia encontrou informações e apoio em comunidades pela internet.

Ela reforça que ser assexual não a impede de ter um relacionamento romântico e nem de beijar outras pessoas (como faz normalmente). “Pode ser que a pessoa não tenha interesse em ter algum tipo de relacionamento sexual, mas romântico sim. Eu sou virgem e acho que não teria problema em tentar, mas sempre tendo essa conversa: entender a necessidade do outro, mas o outro entender a minha necessidade”.

“Desde os 14 anos, eu venho me questionando e sendo questionada de muitas maneiras”

“Já aconteceu de eu estar lá, transando com alguém, e não sentir nada. Eu não conseguia nem fingir que estava bom porque estava muito ruim mesmo. Não é que a pessoa estava fazendo errado, é porque para mim não significava nada. Não sentia uma coceguinha, não sentia nada”, conta a balconista de farmácia Carolina Capucho, de 22 anos.

“Uma coisa que eu acho que você, como assexual, deve se perguntar é: ‘Eu sou assexual ou eu sou frígida?’. E eu não acho que eu sou uma pessoa frígida, porque qual é a ideia de uma pessoa frígida? Ela não consegue relaxar no momento ou então a pessoa está ali muito envolta de uma vergonha. E eu não acho que esse seja o meu caso. Eu sou uma pessoa reservada, eu não saio por aí falando o que eu fiz com alguém, mas não é uma questão de ter vergonha durante o ato. Eu não me sinto assim”, acrescenta ela.

Carolina afirma ter se descoberto assexual ainda na adolescência. “Eu lembro quando eu tinha mais ou menos uns 11 ou 12 anos e já tava todo mundo assim: ‘Ah, eu gosto daquela pessoa’, ‘Eu gosto daquela outra’. E eu não ligava para ninguém. E aí começaram a questionar: ‘Ai Carol, será que você não é lésbica?’. E eu fiquei tipo assim: ‘Não, eu não sou lésbica’. A gente sabe dos nossos interesses. E aí, aos 14 anos, eu lembro de um amigo me contar a definição de assexual, e eu comecei a me identificar com isso”, detalha.

“Um momento assim que foi muito bizarro foi quando eu comecei a namorar e eu recebia muitas perguntas: ‘Você é assexual ainda?’. Como se estivesse ímplicito que, por eu ser assexual, eu não pudesse ter um relacionamento!”.

Para a sexóloga Dani Fontinele, a assexualidade ainda é um tema bastante invisibilizado. “Até a gente começar a falar sobre esse assunto, a mulher assexual era vista como uma mulher frígida: ‘Ah ela é frígida’, ‘Não gosta de sexo porque ninguém nunca catou ela de verdade’, ‘O dia que você fizer um sexo gostoso, você vai parar com essa frescura’. E não é! Outra coisa que não se pode falar é que a pessoa é assexuada. Pelo amor de Deus, esse nome é para ameba! Seres que não precisam fazer sexo para se reproduzir”.

Traumas podem levar alguém a se declarar assexual?

“Não dá para a gente fazer essa correlação”, explica a terapeuta sexual. “A pessoa não está sofrendo com a situação. ‘Ah, tô feliz do jeito que eu sou’. Agora, se a pessoa está sofrendo com aquilo, ela fala ‘Olha, eu queria muito me relacionar com outra pessoa’, a gente vai atrás para tentar entender se a pessoa é realmente assexual ou se aconteceu alguma coisa”.

“A partir do momento que existiu algum trauma, a gente vai tentar ressignificar essa situação, trabalhar isso na terapia. A gente vai avaliar todo esse histórico sexual, como foi a infância e a adolescência dessa pessoa, para ver se aconteceu alguma coisa que traga uma repulsa sexual. Mas aí já é uma coisa diferente, aconteceu algo para a pessoa ter um medo ou receio”, complementa Dani.

Baixa libido

A assexualidade também é diferente da baixa libido, como explica a terapeuta. “Uma pessoa que tem baixa libido, em algum momento, já sentiu atração sexual por outra pessoa, ou de vez em quando até sente. Então, nós buscamos entender se existe algo que pode estar afetando esse desejo sexual. ‘Ah, o relacionamento está uma porcaria, mas quando o relacionamento estava bom, você sentia atração?’. ‘Ah, sentia’. ‘No começo, quando você estava apaixonada, sentia alguma coisa?’. ‘Sentia’. ‘Quando você vê uma pessoa que é bonita, atraente, você consegue se imaginar com essa pessoa? Tem uma atração sexual por essa pessoa?’. ‘Consigo’. Então, nós vamos fazendo essa diferenciação”.

A especialista ainda reforça: “A pessoa também pode falar ‘Ah, não gosto de sexo’. ‘Então, vamos ver o que é sexo para você’. ‘Sexo para mim é penetração’. Pode ser que essa pessoa não goste de penetração, mas curta outros tipos de sexo: masturbação mútua, sexo oral… O que você não gosta dentro dessa relação sexual? Não gosta de sexo ou não sente atração sexual? Às vezes, a pessoa não gosta de sexo mas ela se sente atraída por alguém, gostaria de fazer ou receber um carinho, ter alguma coisa a mais”.

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Fonte: Mulher