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Pessoas gordas e altas em voos: saiba quais são seus direitos

PxHere iG Turismo conversou com o projeto ‘Gorda na Lei’ que atua por meio do ativismo jurídico de combate a gordofobia no País
PxHere iG Turismo conversou com o projeto ‘Gorda na Lei’ que atua por meio do ativismo jurídico de combate a gordofobia no País
 

O número de pessoas obesas no Brasil indicou um crescimento durante a pandemia e as companhias aéreas têm sido criticadas por oferecer assentos desconfortáveis ​​e restrições inadequadas para essa população em seus aviões. A falta de espaço entre as poltronas e a diminuição do tamanho dos assentos têm causado constrangimento entre os passageiros que precisam de uma atenção especial por conta de sua forma física.

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a proporção de obesos na população com 20 anos ou mais de idade mais que dobrou no país entre 2003 e 2019, passando de 12,2% para 26,8%. Nesse período, a obesidade feminina subiu de 14,5% para 30,2%, enquanto a obesidade masculina passou de 9,6% para 22,8%. E de 1974 a 2003, a altura média dos homens passou de 1,67 m para 1,70 m e a das mulheres, de 1,55 m para 1,58 m, e ao passar dos anos, mais crescimento há.

Porém, a discriminação contra pessoas gordas e altas em voos tem sido objeto de discussão em todo o mundo, levantando questões sobre a equidade e justiça no transporte aéreo. Neste contexto, surgem questionamentos sobre os direitos desses passageiros e as medidas que as empresas aéreas devem tomar para garantir o bem-estar e a segurança de todos a bordo.

Além disso, outro debate que surge é o de relacionar pessoas gordas à obesidade por sugerir que todas as pessoas gordas são doentes, e isso é atrelado também a um comportamento gordofóbico da sociedade. O iG Turismo conversou com o projeto Gorda na Lei que atua por meio do ativismo jurídico de combate à gordofobia no país e tem à frente a bacharel em direito Rayane Souza e a advogada Mariana Vieira de Oliveira para explicar alguns pontos importantes.

1. Quais são os direitos de uma pessoa gorda ao embarcar em um avião?

Inicialmente, é importante ressaltar que uma pessoa gorda e uma pessoa não gorda possuem os mesmos direitos ao embarcarem. O direito passa a ser retirado quando o passageiro não consegue se encaixar no padrão atual de medidas dos assentos, nesta situação, a empresa de forma não discriminatória e motivada poderá solicitar a compra de um assento extra ao passageiro.

2. Como lidar com a situação caso ocorra discriminação?

A discriminação em razão do peso pode ser enquadrada como crime de injúria, que consiste em atribuir palavras ou qualidades ofensivas a alguém, desqualificando a pessoa e atingindo assim sua honra e sua moral. Caso isso aconteça, independentemente do ambiente, é importante que a vítima reúna provas do ocorrido e realize um Boletim de Ocorrência.

3. Embora seja possível solicitar a compra de dois assentos, essa é a alternativa adequada ou poderia haver outras?

A resolução n° 280 da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) dispõe sobre a compra de assentos adicionais em caso de Passageiros com Necessidade de Assistência Especial (Pnae), e ainda, concede a estes o assento extra no valor máximo de 20% do valor do bilhete aéreo adquirido. Porém, a regulamentação versa apenas sobre passageiros com dificuldade de locomoção, portanto não há nenhuma norma sobre passageiros gordos. Diante disso, caso a empresa não entenda que o passageiro possui mobilidade reduzida, a ele será cobrada outra passagem em sua integralidade.

Dito isto, há primeiro a necessidade de uma regulamentação que inclua não só pessoas com mobilidade reduzida como pessoas gordas. E cabe reforçar que o tamanho dos assentos dos aviões precisa ser revisto, a maioria das aeronaves não está equipada para estes corpos, e a compra de dois assentos é uma solução paliativa que muitas vezes causa desconforto para o passageiro.

4. Na teoria, todos têm os mesmos direitos, mas na prática como isso se aplica em voos que não comportam corpos fora do padrão?

Infelizmente, há a necessidade de legislações específicas que versem sobre estes corpos.

5. Quais são as formas que uma pessoa gorda pode viajar de maneira confortável em um avião?

Caso o passageiro entenda que é necessário a compra do assento extra, é uma das opções para que viaje de forma mais confortável, mas o passageiro também pode fazer o uso do extensor de cinto gratuitamente solicitando ele para o comissário.

6. A questão financeira também deve ser considerada nesses casos? Por exemplo, se seria viável a compra de mais um assento, mesmo que algumas companhias aéreas auxiliem com descontos?

A questão financeira deve ser avaliada em qualquer situação que discutimos acessibilidade, mas ainda é um debate complexo quando lidamos com uma ausência legislativa sobre o assunto.

Em nota, a Anac disse que a resolução n.º 280/2013, que trata sobre a assistência aos passageiros com necessidade de assistência especial “foi precedida de estudos técnicos rigorosos e de um processo profundo de debate, com intensa participação social, seguindo o rito estabelecido na Lei das Agências Reguladoras”.

Os percentuais de reclamações referentes à Assistência ao Pnae, se comparado com o total de reclamações perante as empresas aéreas no Consumidor.gov.br , são de: 0,93% em 2017, 1,06% em 2018, 1,13% em 2019, 0,22% em 2020, 0,19% em 2021, 0,38% no 2º trimestre de 2022, e 0,51% no 3º trimestre de 2022.

  • – A resolução traz a definição de Passageiro com Necessidade de Assistência Especial (Pnae) e replica trechos da legislação sobre Inclusão da Pessoa com Deficiência ao estabelecer igualdade de direitos em relação aos demais passageiros, mas prioridade nos atendimentos em todas as fases da viagem.
  • – A empresa aérea deve fornecer acompanhante ao Pnae que não tenha autonomia para viajar sozinho; ou, alternativamente, deverá conceder desconto para o acompanhante escolhido pelo Pnae (cobrança limita-se a, no máximo, 20% do valor do bilhete aéreo adquirido); e oferecer desconto de, no mínimo, 80% (oitenta por cento) no valor cobrado pelo excesso de bagagem, exclusivamente para o transporte de ajudas técnicas ou equipamentos médicos indispensáveis utilizados pelo Pnae.
  • – Ainda no sentido de facilitar o transporte aéreo do Pnae, a resolução dispõe que o operador aéreo deve transportar gratuitamente a ajuda técnica empregada para a locomoção do Pnae, limitada a uma peça (art. 23); que as ajudas técnicas e os equipamentos médicos do Pnae, quando despachados, devem ser considerados itens frágeis e prioritários, devendo ser transportados no mesmo voo que o Pnae (art. 25), entre outros, como descontos para acompanhantes em casos específicos (art. 27), previsão de ingresso de cão-guia ou cão-guia de acompanhamento (arts. 29 e 30), e designação de assentos e mecanismos de contenção (art. 31 e ss.).
  • – Caso o passageiro entenda que teve algum direito não observado, recomenda-se procurar o atendimento da empresa aérea para a resolução do seu problema, que pode ser realizado através dos seus canais próprios telefônico, presencial no aeroporto ou eletrônico. Caso o passageiro não fique satisfeito com a solução, sugere-se que registre uma reclamação na plataforma Consumidor.gov.br.
  • – Finalmente, cumpre informar que a Anac está realizando estudos no âmbito do processo de revisão da resolução nº 280 , com vistas à atualização da norma, para aprimorar as disposições e procedimentos de atendimentos ao Pnae. O tema também está presente na Agenda Regulatória do biênio 2023-2024 da Agência, demonstrando que a temática faz parte das prioridades correntes do órgão.
  • – De maneira geral, há medidas sendo feitas, porém, como disseram as meninas do projeto ‘Gorda na Lei’ , a regulamentação, até o momento, “versa apenas sobre passageiros com dificuldade de locomoção”, e caso a empresa não entenda que o passageiro gordo ou alto possui mobilidade reduzida, a ele será cobrada outra passagem em sua integralidade, e nenhuma outra medida será feita.
  • – Cabe ressaltar que, nesta resolução, podem ser contemplados: gestantes; lactantes; pessoas com criança de colo; idosos a partir de 60 anos; pessoas com mobilidade reduzida; pessoas com deficiência; e qualquer pessoa que, por alguma condição específica, tenha limitação na sua autonomia como passageiro.

 

O que dizem as companhias aéreas?

As companhias aéreas brasileiras GOL, Latam e Azul, seguem as recomendações da Anac e aconselham que caso o passageiro precise de assento extra ou extensor de cinto, comunique com antecedência nos canais de atendimento da companhia. Paralelamente, as aéreas internacionais também adotam medidas parecidas. A holandesa KLM e a AirFrance oferecem 25% de desconto na compra de um assento extra, além de oferecerem extensores de cinto.

Já na Delta, os passageiros podem adquirir um assento extra e ela não exige que um passageiro que precise de um extensor de cinto de segurança ou que não consiga abaixar o apoio de braço adquira um assento adicional. Na American Airlines, o passageiro pode solicitar assistência especial ao comprar as passagens, e caso não tenha um assento para acomodar o passageiro, ele pode ser reacomodado para uma classe superior, mas terá que arcar com os custos do upgrade. Ainda assim, se não tiver lugar, ele pode remarcar outro voo sem custos. Mas são apenas essas alternativas feitas até o momento.

Fonte: Turismo