É alto o número de casas noturnas de lazer e espetáculos que adotam a modalidade de comandas ou cartão para pagamento após o consumo dos clientes, entretanto, esta opção dos estabelecimentos precisa ser observada, para não infringir a legislação vigente, causando lesão ao consumidor.
A política desses estabelecimentos prevê multas exacerbadas para clientes que não apresentem suas comandas antes da saída do local, independentemente do motivo, ainda que por furto, roubo, extravio ou caso fortuito, mesmo que tal medida seja totalmente contrária ao Código de Defesa do Consumidor, por ser ilegal e abusiva.
Os responsáveis pelo controle realizado nos bares, restaurantes, casas noturnas e semelhantes são, exclusivamente, de cada estabelecimento, jamais podendo ser incumbido ao consumidor. É indispensável que o estabelecimento que opte pela modalidade de comandas, possua outra forma de controle, a fim de calcular de forma inequívoca o gasto de cada cliente.
Em hipótese alguma o consumidor poderá ser forçado ao pagamento de multa por perda da comanda, ainda que haja a insistência ou intimidação. O estabelecimento utiliza seguranças e impede a saída do consumidor do local, conduzindo-o, contra sua vontade, para “quartinhos” ou salas, com a finalidade de coagi-lo ao pagamento, podendo receber pena de detenção de 3 (três) meses a 1 (um) ano e multa, conforme artigo 71 do Código de Defesa do Consumidor.
O inciso V, do artigo 39, do Código de Defesa do Consumidor elenca como prática abusiva exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva, bem como o inciso IV, do artigo 51 da mesma lei consumerista estabelece que são nulas de pleno direito as cláusulas contratuais que estabelecem obrigações consideradas iníquas, abusivas e que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade.
Tal prática é abusiva, ilegal e inaceitável, os administradores dos estabelecimentos não devem instruir seus funcionários a realizarem tal conduta desmedida, vez que ao realizarem, estão passíveis de incidirem em crime contra a relação de consumo, além de outros crimes como ameaça, constrangimento ilegal, cárcere privado, sequestro e extorsão. Não há lei que obrigue o consumidor a pagar alguma quantia a título de multa por ter perdido a comanda, somente é cabível a cobrança daquilo consumido.
O consumidor que se encontrar em situação de coação ao pagamento por perda de comanda deverá se impor e se recusar a consentir com a prática abusiva, porém, se o estabelecimento conduzir a insistência dessa imposição ilegal, demonstrando iminente possibilidade de agressão, o cliente deverá tentar resolver de forma amigável. Nos casos extremos, deverá o consumidor chamar a polícia através do n.º telefônico 190, buscando proteção do Estado contra essa política abusiva.
Porém, na hipótese do consumidor optar por pagar a abusiva multa, viabilizando evitar maiores transtornos, deverá solicitar que o estabelecimento lhe entregue documento que discrimine o que está sendo efetivamente pago, ou seja, o cupom ou nota fiscal deverá trazer a informação clara e inequívoca quanto a multa por perda da comanda.
Resguardado dessas provas, dentre outras como testemunhas, gravações de áudio e/ou vídeo, o consumidor poderá ser reembolsado em dobro do pagamento indevidamente realizado, buscando amparo da Justiça. Poderá também, pleitear em juízo, reparação por danos morais, caso tenha ocorrido.
Por determinação legal, todo estabelecimento tem o dever de fornecer nota fiscal da compra realizada, sob pena de incidir nos crimes de sonegação fiscal e ordem tributária, conforme artigos 1º e 2º da Lei 8.137/1990.
Kell Mazzini Ribeiro de Camargo – Mestrando do Programa de Mestrado em Direito da Universidade de Marilia.
Profa. Dra. Walkiria Martinez Heinrich Ferrer – Docente do Programa de Mestrado em Direito da Universidade de Marília