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Reviravolta jurisprudencial do STF e a prisão após julgamento em 2ª instância

Reviravolta jurisprudencial do STF e a prisão após julgamento em 2ª instância

De acordo com a Lei 8.038/90, a Lei que regula os procedimentos em processos que tramitam perante o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal, de forma ampla, isto é, tanto na esfera cível quanto penal, os recursos especial e extraordinário são recebidos apenas em seu efeito devolutivo.

Da mesma forma, o artigo 637 do Código de Processo Penal, com sua redação ainda original, isto é, antes de 1988, estabelece que o “recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância, para execução da sentença”. Assim, para a legislação processual, tais recursos não teriam o condão de evitar a prisão do condenado em 2ª instância.

Depois da Constituição de 1988, no entanto, o Supremo Tribunal Federal consolidou entendimento de que a execução da sentença, com a decretação imediata da prisão após 2ª instância, vinha sendo desafiada pelo artigo 5º, LVII, CF – princípio da presunção da inocência –, segundo o qual “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, firmando sua posição, dentre outros julgados, no HC 84.078. Assim, a despeito de não terem os recursos extraordinários efeito suspensivo, a execução provisória da sentença era inconstitucional, somente sendo possível o recolhimento à prisão quando baseado nos pressupostos da prisão preventiva (art. 312, CPP).

Seguindo essa orientação, o legislador pátrio editou a Lei 12.403, em 2011, alterando o artigo 283 do CPP, para a qual “ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”. Assim, o Código de Processo Penal estaria afinado tanto com o texto constitucional quanto com a decisão do Pretório Excelso.

A disposição também consta do artigo 523 do Anteprojeto do novo Código de Processo Penal, segundo o qual, antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, a prisão somente será admitida se se der em flagrante, de forma preventiva ou temporária.

Em 17 de fevereiro de 2016, no entanto, em uma decisão histórica, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 126.292, por 7 votos a 4, decidiu inverter sua orientação, admitindo o recolhimento à prisão com a decisão de 2ª instância, sem a necessidade de que sejam preenchidos os requisitos da prisão preventiva, pois uma decisão em órgão colegiado já seria suficiente para demonstração da culpa do acusado.

Criminalistas e entidades de classe da advocacia têm criticado duramente a decisão, chamada de “desastre humanitário” ou “sistema limitador de garantias”. Enquanto o acórdão não for publicado, resta uma dúvida sobre o alcance da decisão: teria ela declarado inconstitucional o art. 283 do CPP ou alterado o sentido de “trânsito em julgado”? Não se pode precisar, mas ela passa a ter um efeito prático que já temos visto em nosso cotidiano: a regra passou a ser a execução da sentença criminal com a decisão de 2ª instância e milhares de condenados pelo Brasil afora já passaram a ser recolhidos a estabelecimentos prisionais. Hoje, dia 8, foi a vez do ex-Senador Luiz Estevão.

Prof. Dr. Emerson Ademir Borges de Oliveira
Mestre e Doutor em Direito do Estado pela USP. Pós-Doutorando em Direito pela Universidade de Coimbra. Professor Doutor nos cursos de Graduação e Mestrado em Direito na Universidade de Marília. Advogado e Sócio da Borges & Muller Advocacia.