O prezado leitor que considera função do vereador pedir conserto de buracos, uma lombada, um remédio, a vaga pro filho na escola pode parar de ler aqui.
Quem espera algo mais da Câmara e pretende discutir o trabalho do Legislativo está convidado a seguir e comentar, para acrescentar ou discordar.
A Câmara de Marília virou um puxadinho da prefeitura. A acusação foi feita em plenário na noite desta segunda. E reflete uma das tradições políticas da cidade.
Raros momentos de independência – na maioria das vezes à mais simples pressão para atender desejos de vereadores – se perdem sob montanha de debates ocos, subserviência e práticas que beiram piadas, não fossem trágicas.
A bola da vez foi a votação de projetos para doação de áreas a empresas. Embutem ideia de investimentos e empregos contrapostos a medidas públicas.
Típico momento para Legislativo e executivo atuarem juntos. Mas que como em todo o resto envolvem aspectos legais, técnicos e clareza.
A discussão rasa rejeitou dois projetos. O conteúdo técnico dos dois era rasteiro. E a situação ainda teve momentos piores.
Uma instalada má vontade oficial da prefeitura em dar informações – outra tradição local – a absoluta falta de vontade dos governistas para discutir as informações e oposição com poucos argumentos – entre vários possíveis –.
Caiu na rejeição de projetos que poderiam ser bons, não será possível saber.
Mas não é de agora que a discussão raramente entra na qualidade técnica das doações.
Quantas empresas querem áreas? Qual o critério para escolher? Quantas das empresas escolhidas realmente não poderiam ter uma área e com apoio trariam grande retorno? Quantas poderiam comprar as próprias áreas e crescer sem a bengala pública?
Nada disso esteve na Câmara, como não está no dia-a-dia da cidade. Conselhos técnicos tocariam isso melhor que os gabinete na prefeitura e na Câmara.
Havia uma acusação de falta de informações. Ela poderia ser superada? Claro. A Câmara poderia passar por isso e aprovar os dois. O fez em outros casos.
Mas também jogou fora – outra vez – a chance de cobrar e tomar medidas práticas por mais respeito da prefeitura. A falta de informações e detalhes atropela os vereadores mas em visão final ignora os eleitores.
O bate-boca foi a cereja do bolo ruim.
Rezende fazer do seu mandato um palanque de apoio ao prefeito é direito dele, seus eleitores que o julguem.
Mas as acusações de “chegou ontem”, é um ‘escorpião” são tão vazias quanto pessoais e não cabem na postura da presidência.
A cidade é recheada de lideranças vindas de outras cidades – o próprio Rezende, Daniel Alonso, Abelardo Camarinha e tantos outros -.
Vazia na mesma medida a discussão de que o apoio em campanha exigiria reciprocidade no mandato. Bem, Rezende fez campanha com Vinícius Camarinha, de quem foi aliado.
A Câmara que protagonizou essa noite tão cheia de vazios é a mesma que em passado recente aprovou e concluiu duas CPIs, resgatou debates da tribuna livre, lançou casos de pareceres jurídicos independentes antes de votações.
Impor independência, unir qualidade técnica e política, promover o bom comum legislando e fiscalizando, representar cidadãos e serem eco para voz da comunidade são expectativas básicas para a Câmara. A de Marília ignorou muito disso ontem.
A sessão acabou com dois projetos rejeitados, debates vazios e mal feitos e um desperdício do poder que existe para ser espelho da cidade. Não parece ser a melhor imagem para Marília.