Marília

Final de ano e cidadania: lembrando Montoro

Final de ano e cidadania: lembrando Montoro

Todo final de ano é uma boa oportunidade de refletirmos sobre o ano que se passou. Algo que tem sido motivo de muita discussão é o conceito de cidadania, considerando o momento singular de grandes transformações pelo qual passa o Brasil, calcado em manifestações internas e externas, nas áreas econômica e social. É com isto que na atualidade o conceito atribuído ao cidadão ganha uma nova dimensão, ou seja: aquele que tem direito a ter direitos. Pela concepção antiga o cidadão era aquele que tinha direito a votar e ser votado, notadamente no mundo ocidental. Por certo, um entendimento de exclusão em que a maioria da população sequer podia exercer a sua cidadania, provocando uma injustiça social.

No entanto, dentro do novo conceito de cidadão, podemos identificar na sociedade quatro tipos de cidadãos, isto considerando ser necessária uma análise mais acurada sobre o assunto.

O primeiro tipo de cidadão pode ser chamado de meio-cidadão – não no sentido pejorativo do termo – mas aquele que não sabe dos seus direitos porque não lhe foi proporcionada tal condição através do sistema educacional, por exemplo. Isto tendo em vista como está organizado o Estado na atualidade.

O segundo tipo, o cidadão passivo. Ele tem consciência dos seus direitos, mas tem forte descrença nas instituições, especialmente as públicas, e por isto não luta pelos direitos. Infelizmente, encontra-se nestes dois primeiros estágios a maioria da população.

Em terceiro lugar, encontra-se o cidadão ativo, que sabe dos seus direitos e luta para defendê-los, porém, continuamente na perspectiva individual e com uma preocupação candente em aumentar a cumulação do seu patrimônio. Trata-se de um grupo menor na sociedade, sendo boa parte deste remanescente do que podemos denominar de classe média.

Por fim, o quarto tipo, o cidadão ativo e solidário. São poucos, mas lutam incansavelmente pelos seus direitos e pelos direitos dos outros, numa perspectiva do bem comum. São constantemente motivados para uma mudança de posição, mas seus princípios éticos, adquiridos essencialmente na família e numa espiritualidade, sempre se sobrepõem. É aqui que podemos identificar pessoas como os políticos Igino Giordani (italiano) e André Franco Montoro. Eram personalidades que viviam a dimensão material, mas sempre ressaltando o plano espiritual e quotidianamente deixando transparecer um altruísmo natural. Sabiam que a felicidade podia ser encontrada no outro, quando se busca a realização da fraternidade. Na verdade, acreditavam, e nos legaram tal pensamento, que a tão sonhada unidade das pessoas só se concretiza com a ação desinteressada daqueles que a vocação lhe reservou um papel especial na história da humanidade.

Franco Montoro sempre encontrava uma saída inteligente e humana para os complexos casos que lhe eram submetidos, sem abandonar os princípios da ética. De forma freqüente afirmava que “mais grave que a miséria dos famintos é a inconsciência dos fartos”. O convívio com ele era contagiante, pois sempre tinha um folheto ou um livro para oferecer às pessoas como forma de ajudá-las a não esquecer o compromisso de responsabilidade para com a sociedade. O exemplo de amor à vida dado por Montoro é digno de ser seguido, alguém que sempre almejou a construção de uma sociedade justa, solidária e unida.

Não era diferente com Igino Giordani que considerava a política como uma transcendência para alcançar objetivamente o bem comum. Aliás, gostava de repetir o Papa Paulo VI, que dizia, “a política é uma forma superior de exercício da caridade” para afirmar: “Elimina da vida o amor, e a vida se congela. Elimina das relações sociais o amor, e a terra se torna uma Antártida só.”

É fácil observar que a nova cidadania do século XXI vem conectada com o conceito de justiça, uma justiça participativa que pode garantir a sobrevivência, a democracia e o progresso evolutivo da sociedade humana. Justiça participativa e cidadania andam juntas. As duas se completam mutuamente, atuam juntas, espalham vida e dão-se apoios. Juntam as mãos na caminhada da harmonia, da solidariedade das nações e da paz. Isto porque, as relações entre as pessoas e os povos não podem ser determinadas pelo medo, mas pela participação, pois a justiça participativa (e o novo conceito de cidadania) é capaz de conduzir os seres humanos a uma concepção honesta e múltipla, donde poderão nascer muitos benefícios materiais e espirituais, que podem conduzir a sociedade no caminho da gentileza, da justiça e da fraternidade.