O promotor de Justiça Oriel da Rocha Queiroz protocolou nesta sexta-feira na Justiça Estadual de Marília uma denúncia contra o ex-prefeito Vinícius Camarinha, o atual vereador Danilo Bigeschi, ex-assessor da Secretaria de Saúde; e os ex-secretários da pasta, Fernando Roberto Pastorelli e Hélio Benetti, por improbidade administrativa na compra de 450 tablets para a secretaria em 2016.
Segundo a denúncia do promotor, a compra foi resultado de um processo de licitação comprometido por cláusulas restritivas à livre participação de empresas; ajustamento prévio entre as empresas, que seriam relacionadas direta ou indiretamente a Fauzi Fakhouri Junior, cunhado do vereador, e “evidente superfaturamento” de preços dos tablets. Além dos quatro, a denúncia acusa a empresa vencedora da licitação, Kao Sistemas de Telecomunicações, e outros participantes da licitação.
A denúncia chega à justiça nove dias depois de a Polícia Federal deflagrar uma operação especial de investigação do caso que podem resultar também em medidas do Ministério Público Federal, já que a compra envolve recursos federais do Ministério da Saúde.
Segundo a denúncia, os agentes públicos, “agindo com dolo e culpa grave, permitiram ou facilitaram a aquisição dos tablets a preço estratosfericamente superior ao valor de mercado” e “frustraram a licitude do referido pregão presencial 135/16”.
O promotor acusa ainda as empresas de orquestrarem modelo de licitação direcionado. Os tablets foram comprados por R$ 1,08 milhão, com custo individual de R$ 2.405 por cada equipamento.
A denúncia é resultado de um inquérito civil aberto a pedido da ONG Matra (Marília Transparente) depois que o Conselho Municipal de Saúde, que atua no acompanhamento de gastos, apontou suspeitas sobre a compra dos equipamentos.
ACUSAÇÕES
A inovação da denúncia em relação ao trabalho da Polícia Federal é a inclusão do ex-prefeito e do ex-secretário Hélio Benetti como acusados. Os dois não estavam entre os alvos da operação federal.
Para o promotor, o “ex-prefeito delegou as funções de superintender e processar os procedimentos de licitação, sua dispensa e inexigibilidade a seus secretários e auxiliares diretos” e essas medidas seriam “indelegáveis”.
“Não bastasse, o ex-prefeito falhou com o dever de gerir, fiscalizar e supervisionar as condutas de seus auxiliares diretos Hélio Benetti, Danilo Bigeschi e Fernando Pastorelli, designados para atuarem em postos chaves da secretaria da Saúde.”
Vinícius Camarinha, prefeito de Marília na época em que os tablets foram comprados
Danilo Bigeschi, atual vereador e supervisor de saúde concursado, ocupava funções de confiaça nomeado por Vinícius. Para o promotor, Danilo ocupou cargo de substituto do secretário e responsável pelo expediente na Secretaria e mesmo sem assinar qualquer ato na licitação atuou internamente para o esquema de favorecimento à empresa de seu cunhado, Fauzi.
A denúncia envolve acusação de relações do cunhado com todas as empresas participantes da licitação, com apontamento de concorrentes que usavam mesmo endereço, receberam em algum momento serviços ou medidas do mesmo advogado. A licitação, de acordo com o processo, envolve até documentos com data inexistente: proposta com data inexistente: 30 de fevereiro de 2016.
“Hélio, Danilo e Fernando em conluio com representantes legais das empresas permitiram e facilitaram a aquisição dos tablets a preço flagrantemente superfaturado”, diz o promotor.
Fernando foi coordenador e secretário interino na pasta da Saúde e segundo o promotor figurou como responsável pela cotação de preços “enviando emails tão somente às empresas requeridas com as quais manteve contato prévio”. Hélio Benetti, de acordo com a acusação, foi o responsável pela cláusula restritiva que exigia engenheiro elétrico nas empresas, profissão do empresário Fauzi Fakhouri, para direcionar a licitação.
O promotor aponta ainda situações como orçamentos enviados pelas empresas com data anterior à requisição de compras. Cita também ligação pessoal dos acusados, como doação de recursos do ex-secretário Fernando à campanha eleitoral de Danilo e sua posterior nomeação para atuar como chefe de gabinete do vereador.
A denúncia está na Vara da Fazenda Pública e aguarda decisão do juiz Walmir Idalêncio dos Santos Cruz. Entre os pedidos, está condenação dos requeridos pela lei de improbidade, que prevê devolução dos recursos, perda de direitos políticos e de função pública, além de possibilidade de multa.
Danilo Bigeschi, servidor de carreira e hoje vereador, denunciado no caso dos tablets
OUTRO LADO
O ex-prefeito Vinícius Camarinha disse em nota enviada ao Giro Marília que “cada secretario detinha autonomia de gestão e contratação” e que “deixou a prefeitura sem responder a nenhuma ação de improbidade e tem todo interesse no esclarecimento dos fatos”. Segundo o ex-prefeito, a delegação de funções é permitida pela Lei Orgânica do Município. “Não há nada de irregular nisso.”
Fernando Pastorelli, que hoje é assessor do vereador Danilo, afirmou que o processo de licitação foi todo feito “de acordo com o que rege a lei” e que entende a apresentação da denúncia mas confia na Justiça e que “a denúncia é novidade mas cabe agora explicar tudo e mostrar que não houve qualquer irregularidade.”
De acordo com o ex-secretário, a compra não envolve só os valores dos equipamentos, mas um contrato de prestação de assistência técnica, que justifica os preços, e que todas as exigências da lei de licitações foram cumpridas. “Não tem irregularidade, não teve qualquer ato obscuro.”
O Giro procurou o ex-secretário Hélio Benetti, mas ele não foi encontrado para falar sobre o caso.