Marília

Prefeitura demorou. O protesto também

Dois dos 13 vereadores de Marília já tiveram dengue. Leve esta proporção para as ruas e você vai encontrar pelo menos 35 mil moradores com dengue. E é pura especualção. Pode ser muito mais. Os números oficiais falam em 4.000.  Não deve haver forma de calcular o número real. Ele com certeza está muito acima do oficial. Mas não é só isso que faz da dengue um tema do momento.

Pacientes sofrendo, postos de saúde lotados, falta de remédios básicos como dipirona – sem falar nos problemas como crianças comendo arroz com vinagrete enquanto a prefeitura desperdiçava dinheiro – não são novidades.

Vinícius Camarinha não inventou este quadro e não é o primeiro prefeito a enfrentar epidemia de dengue. É o primeiro a enfrentar tantas mortes, sob a suspeita de que morreu mais gente do que se fala, assim como há mais pacientes do que a administração assume.

E é o primeiro a enfrentar o ambulatório da Santa Casa lotado de pacientes com dengue. É o primeiro a enfrentar o atendimento dos planos de saúde entupidos com casos de dengue. Assim como os buracos, a cidade democratizou a dengue. Todos os bairros, todas as classes. Com mortes.

Muitos são moradores que não faziam da saúde seu assunto do dia-a-dia, do papo no almoço de domingo. Não tinham idéia – ou não davam importância ao fato – de que o posto de saúde pode ficar sem um tubinho de analgésico, que a espera é desconfortável para quem sofre e vê familiar sofrer. A classe média descobriu a crise da saúde.

A prefeitura não fez a prevenção como devia e podia, isso é fato que alguns vereadores – assim como a administração – tentam negar. O país tem muitas cidades com epidemia? Claro. Também tem muitas sem epidemia.

Soa errado falar de incompetência. A equipe técnica da saúde é bastante capacitada. É basicamente a mesma que nos anos anteriores evitou ou enfrentou a epidemia. Boa parte dela esteve com o grupo que está no poder várias vezes. Falta de vontade em pensar dengue o ano todo seria uma acusação mais perto do real.

O protesto ganhou caronas, como dizem os defensores da administração? Claro. Eles não deveriam usar a dengue como palanque. É uma parte dos manifestantes que usa a epidemia como um segundo turno, um resto atrasado de campanha para quem não engoliu a eleição de Vinícius. Não deveriam. E nem devem usar as mortes como palanque para a próxima eleição.

Mas usar o combate à epidemia como palanque pode Arnaldo?. Gente morreu. Famílias perderam entes queridos. Famílias inteiras estão sofrendo com casos e estão com medo de ver filhos, avós, tios morrerem.  Se não fica bem usar isso para fazer crítica política, também não fica bem sorrir prometendo a disputa do século. Esse jogo já foi perdido em cada morte. O trabalho é não levar goleada, aprender com tudo isso.

Não dá só para combater a epidemia e ponto? Sem palanque, sem oba oba. E de mostrar ações para que a epidemia, se voltar a acontecer, não tenha tanto força, não pegue a cidade tão desprotegida. Faltam macas, falta soro, faltam analgésicos, falta gente para atender nos postos, faltam postos para atender.

Os mutirões de limpeza são mentiras, como o que está em prática e começou pela zona norte nesta segunda. Bem, ele deve mudar de região nesta terça (24),  mas pelo menos dois bairros já têm notícias de que os caminhões não passaram. Os agentes não visitaram as casas. O entulho não foi coletado, os mosquitos não foram “fumaceados” assim como os buracos não são fechados ou como o mato não é cortado.

Os defensores do prefeito disseram em seus discursos que os vereadores não podem fazer nada. Errado. Podem fazer pressão, podem cobrar do prefeito explicações sobre as ações de prevenção, podem entrar no protesto com a população, podem levantar as dúvidas a cada votação de gastos, de orçamento. Eles não estavam no meio do povo.

Mas a comunidade da periferia que mais sofre com a falta de estrutura para tratar dengue também não. Aliás, nem a classe média esteve no protesto. Quem prometeu ir não esteve no protesto. 

E os mais sofridos vão gostar de Chitãozinho e Xororó (embora eu também ache estúpido a cidade gastar tanto em um megashow em momento de crise. Com muito menos faria shows de artistas locais o mês todo em todos os bairros.) Os mais sofridos não vão a shows, não têm opções de lazer. Vão adorar ver Chitãozinho e Xororó. É com isso que a administração conta,

Mas onde estava o protesto quando foi aprovado o orçamento que prevê R$ 1,2 milhão para que a Secretaria da Cultura contrate empresas – como a produtora do show-? O protesto não foi à Câmara pedir cultura popular. O protesto não foi à Câmara pedir mais verbas para prevenção da dengue.

O protesto, assim como o trabalho contra a dengue, chegou tarde. Para algumas famílias, tarde demais. Agora a administração e os manifestantes podem pensar mais no futuro. Aonde vamos todos estar na próxima sessão, no próximo orçamento, nos próximos debates sobre a verba da saúde e até na próxima eleição?