Marília

Taxa do Lixo – Pesquisador aponta discussão judicial e orienta: aguardar

Taxa do Lixo – Pesquisador aponta discussão judicial e orienta: aguardar

A polêmica sobre a criação da Taxa da coleta do Lixo em Marília ganhou nesta quinta-feira uma avaliação jurídica do professor e pesquisador em direito da Unimar Emerson Ademir Borges Oliveira, vice-coordenador do programa de Pós-Graduação na área: ele orienta Câmara a aguardar andamento de discussões judiciais.

Segundo o pesquisador, pelo menos três ações de inconstitucionalidade foram apresentadas no STF (Supremo Tribunal Federal) contra a lei federal que é usada como base para criação da nova taxa. O professor explica ainda que há controvérsias grandes sobre a legalidade e legitimidade da regulamentação.

“Mais importante, o Ministro Presidente do STF pautou julgamento das ações para novembro.Diante disso, penso ser muito mais prudente aguardar o julgamento do STF do que instituir uma Taxa que pode ser declarada inconstitucional”, diz o pesquisador.

A análise questiona ainda o principal argumento da prefeitura em defesa da taxa: a eventual necessidade de uma compensação por renúncia de receita. Esse é um dos pontos questionados no STF.

“ A lei mudou a definição de renúncia de receita sem mudá-la. Oi? Ela equipara a não instituição de uma taxa a uma renúncia de receita, mas a definição de renúncia de receita está no artigo 14, parágrafo primeiro, da LC 101 e parte do pressuposto de que o Tributo exista no ente federativo (o que não é o caso)”, diz Emerson Borges.

Mestre e Doutor em Direito Constitucional pela Universidade de São Paulo, o professor divulgou sua análise em um texto em redes sociais. Veja abaixo a íntegra da mensagem

Sobre a Taxa do Lixo

Há uma discussão atual em nossa cidade acerca da edição de lei municipal para instituição da Taxa do Lixo. Isso em razão do disposto na Lei 14.026/2020, que alterou o Marco Legal do Saneamento Básico (Lei 11.445/2007), em especial seu artigo 35, que passou a ter a seguinte redação:

Art. 35. As taxas ou as tarifas decorrentes da prestação de serviço de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos considerarão a destinação adequada dos resíduos coletados e o nível de renda da população da área atendida, de forma isolada ou combinada, e poderão, ainda, considerar:

II – as características dos lotes e as áreas que podem ser neles edificadas;

III – o peso ou o volume médio coletado por habitante ou por domicílio.

IV – o consumo de água; e

V – a frequência de coleta.

§ 1º Na hipótese de prestação de serviço sob regime de delegação, a cobrança de taxas ou tarifas poderá ser realizada na fatura de consumo de outros serviços públicos, com a anuência da prestadora do serviço.

§ 2º A não proposição de instrumento de cobrança pelo titular do serviço nos termos deste artigo, no prazo de 12 (doze) meses de vigência desta Lei, configura renúncia de receita e exigirá a comprovação de atendimento, pelo titular do serviço, do disposto no art. 14 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, observadas as penalidades constantes da referida legislação no caso de eventual descumprimento.

§ 3º Na hipótese de prestação sob regime de delegação, o titular do serviço deverá obrigatoriamente demonstrar a sustentabilidade econômico-financeira da prestação dos serviços ao longo dos estudos que subsidiaram a contratação desses serviços e deverá comprovar, no respectivo processo administrativo, a existência de recursos suficientes para o pagamento dos valores incorridos na delegação, por meio da demonstração de fluxo histórico e projeção futura de recursos.

A não criação em si de uma taxa prevista na legislação federal não implicaria em renúncia de receita, nos termos do artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

O problema foi o disposto no parágrafo segundo acima, o qual, na prática, passou a presumir que a não instituição pelo Município equiparar-se-ia a renúncia de receita. Assim, caso o Município não crie deverá demonstrar o preenchimento dos requisitos dispostos na LRF.

Há, no entanto, pelo menos 3 grandes problemas, a meu ver:

1 – primeiramente, poderíamos estar diante de uma violação do princípio do federalismo em razão da determinação de uma lei federal para criação de uma taxa municipal, a qual deverá ser competência a ser exercida ou não pelos municípios. Além disso, vale lembrar que se trata de tema municipal e de interesse local (art. 30, I e II, CF);

2 – de acordo com a CF (art. 146, III) cabe a Lei Complementar estabelecer normas gerais sobre tributos, especialmente sobre definição, fato gerador, base de cálculo e contribuintes. A lei federal em questão é Ordinária e, portanto, não poderia tê-lo feito;

3 – a lei mudou a definição de renúncia de receita sem mudá-la. Oi? Ela equipara a não instituição de uma taxa a uma renúncia de receita, mas a definição de renúncia de receita está no artigo 14, parágrafo primeiro, da LC 101 e, como pode ser visto abaixo, parte do pressuposto de que o Tributo exista no ente federativo (o que não é o caso):

§ 1o A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado.

Até porque, convenhamos, não tem como justificar a renúncia de um tributo não instituído. Se o tributo não foi criado, é impossível prever a quanto se renunciaria, impossibilitando a renúncia, senão por mera adivinhação.

Novamente, o legislador federal comprovou sua péssima técnica e desconhecimento.

Há no STF as ADIs 6.536, 6.492 e 6.583 contra a lei, incluindo questionamentos acima delineados. Mais importante, o Ministro Presidente do STF pautou julgamento das ações para novembro.

Diante disso, penso ser muito mais prudente aguardar o julgamento do STF do que instituir uma Taxa que pode ser declarada inconstitucional, trazendo, se não houver modulação, o dever de restituir todos os pagamentos realizados e não prescritos. Até porque, para ser franco, os doze meses de prazo já transcorreram…