Mais um 13 de maio se aproxima! A luta pelas conquistas dos direitos dos negros ainda é incipiente e acobertada, em muitos pontos, pela vagueza da sua real indignação.
A recente posição de alguns alunos da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, do campus da USP de Ribeirão Preto, em abrir a discussão sobre a possibilidade de cotas para estudantes negros, deixa, pelo menos para mim, claras duas questões.
A primeira é a confusão que muitos ainda fazem acerca dos temas, diferença e desigualdade e a segunda é que, para tratar de qualquer assunto relativo aos negros, como a questão das cotas, é preciso, antes de tudo, ouvi-los.
Parece-me que a desigualdade nasce em razão da diferença. Por mais que possamos discutir a diferença, é na sua consequência, ou seja, na desigualdade, que reside todo “problema”.
Para nós, “a diferença se coloca no mundo do ‘ser’, enquanto a desigualdade pertence ao mundo do ‘estar’ ou das circunstâncias. Vermelho é diferente do azul, mas um pintor pode dispensar um tratamento desigual ao uso destas duas cores em uma pintura, conforme enfatize mais uma ou outra” (José D’Assunção Barros. A construção social da cor. Petrópolis: Vozes, 2009. p. 24).
Lamentável, pois, lastimável o fato de o humano privilegiar um em detrimento do outro em razão única e exclusiva das “diferenças de cor”, cuja determinação se dá pela “quantidade e tipo do pigmento melanina presente na derme, e que sua variação é controlada por apenas quatro a seis genes” (STURM apud BARROS:2009, 10).
Assim, a diferença consistente em “ser branco” ou em “ser negro”, desde essa visão bipartida , não será eliminada. O foco, então, deve ser a desigualdade. É ela e não a diferença que tem de ser eliminada.
Por segundo, como afirma Machado de Assis, “o homem não pode compreender senão as penas que já padeceu”. Quero dizer, com isso, ser preciso dar condições, proporcionar espaços para que o negro possa expor a sua dor exatamente como afirmado pelo cancioneiro, “tire o seu sorriso do caminho que eu quero passar com a minha dor” (A flor e o espinho, de Nelson Cavaquinho).
Sem ouvir o negro, não perceberemos a brutal desigualdade a impedir seja ele inserido – inclusão social –, por exemplo, na Universidade. A luta, portanto, é fundamental para que se possa refletir acerca de ações afirmativas cujo ideário seja admitir a diferença e eliminar a desigualdade.
Dignos de aplausos os alunos do curso de direito da FDRP/USP pela iniciativa de, concretamente, discutir a questão da cota racial na Universidade. O fato desse discurso ter ocorrido no seio do curso de direito, simbolicamente, dá-lhe mais força, haja vista ser da essência do direito a luta contra o Poder.
O grau de atenção que for dispensado a essa iniciativa nos mostrará se ainda, no Brasil, “o melhor é ser homem e branco”, como afirmado por Alberto Carlos De Almeida, no livro intitulado A Cabeça do Brasileiro (p. 15) ou, então, se estamos, realmente, caminhando para uma sociedade livre, justa, solidária e sem preconceito de cor (CF, art. 3.º), mas, nunca se esquecendo de que “a legalidade é uma questão de poder e não de justiça”.
I have a dream!
Benedito Cerezzo Pereira Filho é professor de Direito Processual Civil da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, campus de Ribeirão Preto