Orei a Deus por paz de espírito, ele me deu Alprazolam.
Reclamei? Não, estava muito calma para reclamar de qualquer coisa, ou como diz o povo por aí, estava extremamente brisada para entrar em qualquer tipo de discussão, seja com um reles humano ou com qualquer divindade.
Perdoo-me por minha insignificância e ansiedade também.
Num país onde mal lidamos com a morte do nosso representante maior do esporte e que logo nos toma de sobressalto a invasão e destruição do patrimônio público, somado a tudo isso, uma vida pessoal que vem cheia de atropelos.
Senhores estamos em uma montanha-russa emocional. Se você tem lá seu Alprazolam, seja ele qual for, de minha parte sinta-se perdoado.
Porque se alguém consegue lidar com tudo o que vivemos sem buscar uma muleta, preciso conhecer urgentemente.
Soma-se a tudo isso a natureza que está respondendo à altura todos os maus tratos sofridos, uma overdose de informação e desinformação, Big Brother Brasil que, literalmente, pode ser trocado por Big Tretas.
Pautas de 200, 300 anos, ou até mais, revisitarão a humanidade de pessoas presas em uma casa sendo filmadas 24 horas.
Você daria conta? Eu seria plenamente humana: invejosa, fofoqueira, maledicente, egoica, cheia de mim mesma e de minhas razões, logo, seria cancelada.
Termo que euzinha, uma senhorinha de tudo nas redes sociais, abomino.
Cancelar é o mesmo que banir, ora bolas, quem é banido não tem o direito de aprendizado, de correção, de desculpas.
Se vocês me conhecessem com meus 15, 20 e poucos anos, estariam lidando com uma pessoa que pensava e vociferava coisas horrorosas.
A mudança veio através da escuta, leitura, reflexão e ainda assim, digo com toda convicção, melhorei um pouquinho.
Ainda sou uma mulher que falhará ao reproduzir racismo, machismo, homofobia. Quando dizemos ser estrutural, é porque é de base da sociedade e está tão entranhado em nós que, em algum momento, seremos nós, os infelizes, que produziremos tudo aquilo que abominamos.
É preciso estar atento o tempo todo para não ser mais um que agride, ofende ou trata com desdém outra pessoa.
Antes que pedras chovam sobre meu humilde texto, não defendo crimes, racismo e homofobia, assim são, escrevo para pensarmos antes de atropelarmos pessoas nas suas humanidades.
O que tiver que ser corrigido e penalizado, que o seja hoje. Buscar textos, vivências, comportamentos do passado, nos reduz, a todos, como nossos próprios algozes.
Não me orgulho do que já fui, do que já pensei, do que eu já disse. Faltava-me aporte, conhecimento, leitura para entender inúmeras coisas.
Mas, à parte isso, continuo sendo plenamente humana, errando como nunca, sentindo o que muitas vezes condeno.
Não passaria pelo crivo de quase ninguém, sou detestavelmente humana e falha, insuportável para uma sociedade tão ruim e que não suporta a humanidade.
Pelo menos hoje tenho o meu Alprazolam e uma casa de vidro para espiar e condenar o que no outro há em mim.
Esperando, cansavelmente, que a paz de espírito venha em drágeas.
Deus, não me abandone.