De acordo com a pesquisa “Vaginal Health: Insights, Views & Attitudes (VIVA-Latam) – results from a survey in Latin America” apenas 25% das mulheres pós-menopausa que sofrem com secura vaginal na América Latina buscam tratamento adequado, por acreditarem que é uma parte natural do envelhecimento e que devem se acostumar com as dores e desconfortos.
Para desmistificar a secura vaginal como algo que afeta apenas mulheres menopausadas, por causar dores e trazer desconfortos para a vida de mulheres em diferentes faixas etárias por diversas razões (uso de remédios, questões hormonais, tratamentos de doenças etc), conversamos com a ginecologista especializada em ginecologia endócrina Anna Gueldini. Confira a entrevista.
iG Delas: O que causa a secura vaginal?
Anna Gueldini : Os estrogênios são particularmente importantes na manutenção do tecido vaginal saudável. Qualquer situação em que os níveis de estrogênio estiverem mais baixos pode fazer com que os tecidos que recobrem a vagina se tornem mais finos, secos, sensíveis e inflamados, caracterizando a atrofia vaginal ou vaginite atrófica, popularmente conhecida como ressecamento ou secura vaginal. Com isso, a vagina também se expande com menos facilidade durante o sexo, pode apresentar fissuras e sangramentos, tornando um ato que deveria ser prazeroso em desconfortável e/ou doloroso.
É um problema específico da menopausa ou pode surgir em outros momentos?
O ressecamento vaginal pode acometer mulheres de todas as idades que vivenciam situações de deficiência estrogênica. Apesar de ser um problema mais frequente em mulheres com mais de 50 anos, a atrofia vaginal, pode afetar mulheres mais jovens, mesmo antes da perimenopausa. Então, embora o climatério seja a principal causa da atrofia vaginal, ela não é a única.
Devido à queda hormonal abrupta, o período pós-parto e o período de amamentação também podem influenciar (e muito) no surgimento do ressecamento vaginal. Isto acontece, pois o hormônio responsável pela lactação, a prolactina, que se eleva nestes períodos, inibe a produção de estrogênio, responsável por manter a mucosa vaginal lubrificada e elástica. Além disso, este é um período de vulnerabilidade emocional para as mulheres, por conta das cicatrizes, eventuais lacerações perineais, privação de sono e estresse físico e emocional.
Outras situações em que mulheres de todas as idades podem cursar com ressecamento vaginal são aquelas vivenciadas durante tratamentos oncológicos, como quimioterapia, radioterapia e terapia endócrina para bloqueio dos tumores; durante uso prolongado de alguns anticoncepcionais; durante o uso prolongado de anti-histamínicos (eles ressecam a mucosa, inclusive a vaginal); além da presença de outras condições clínicas que causam distúrbios hormonais, como a hiperprolactinemia (aumento patológico da prolactina) e a amenorreia hipotalâmica (ausência de menstruações por disfunções no hipotálamo, que pode ser secundária a perda excessiva de peso, excesso de atividade física ou estresse excessivo).
Quais as melhores formas de tratamento?
Existem diferentes tratamentos para o ressecamento vaginal. De acordo com as evidências atuais e com as principais sociedades médicas (Sociedade Norte Americana de Menopausa – NAMS, Associação Brasileira de Climatério – SOBRAC e Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia – FEBRASGO) a escolha do tipo de tratamento depende da gravidade dos sintomas, da eficácia e segurança dos tratamentos disponíveis e da preferência individual de cada paciente.
A terapia de primeira linha para sintomas leves de ressecamento vaginal inclui opções não hormonais, como o uso de lubrificantes durante a atividade sexual (que só agem quando são aplicados, reduzem o atrito local, mas não tratam o ressecamento) e de hidratantes intravaginais de ação prolongada, que devem ser usados regularmente. Os hidratantes intravaginais não contêm hormônios em sua composição, hidratam a região e têm ação contínua e residual (72h) conforme o uso.
Nos casos em que os sintomas são moderados e graves, ou para mulheres com sintomas persistentes após intervenções não hormonais, a terapia estrogênica, vaginal ou sistêmica é recomendada, sendo o uso tópico do estrogênio vaginal o tratamento mais eficaz para o manejo dos sintomas.
Além dos tratamentos convencionais acima citados, novas tecnologias à base de energia, como laser e radiofrequência, podem ser usadas para ajudar no tratamento da secura vaginal, contribuindo para a saúde íntima e bem-estar sexual da mulher. Essas tecnologias são aplicadas diretamente na mucosa vaginal, dentro do consultório médico, com o intuito de estimular a vascularização e a produção de colágeno, melhorando assim a lubrificação e a função locais. É importante lembrar que esses procedimentos devem ser feitos por um ginecologista capacitado, com treinamento adequado nestes equipamentos, para avaliar a mucosa vaginal, fazer indicações precisas e contraindicar o uso destes recursos quando houver alguma condição subjacente.
Como os lubrificantes devem ser usados? Só no momento das relações sexuais ou de forma preventiva?
Os lubrificantes não tratam a atrofia vaginal – eles devem ser usados somente no momento das relações sexuais para diminuir o atrito e não devem ser usados de forma preventiva. Já os hidratantes intravaginais, esses sim podem e devem ser utilizados preventivamente.
Quais os principais efeitos da secura vaginal?
As consequências físicas do ressecamento vaginal têm ligação direta com o afinamento e inflamação da mucosa vaginal. Em condições normais hormonais, a vagina é composta por camadas, que conferem suas características e atuam como uma barreira de proteção. Com a queda dos níveis hormonais, como a que ocorre pós menopausa ou em qualquer uma das situações que citei anteriormente, a vagina passa a ter menos camadas, ocorrendo uma diminuição da espessura do seu revestimento interno, que a torna mais sensível, menos protegida e mais vulnerável a sofrer algum tipo de traumatismo.
Os sintomas mais comumente referidos pelas mulheres são a secura, queimação, irritação, coceira e dor durante a relação sexual, além de mudanças no odor e uma maior susceptibilidade de ocorrência de disbiose local, pela perda da população de lactobacilos (bactérias “do bem”, que formam um escudo protetor para o ecossistema vaginal). Portanto, o ressecamento vaginal é uma questão atrelada à saúde feminina e não somente uma queixa da vida sexual.
Emocionalmente, o impacto desta condição pode ser avassalador, especialmente se não houver diálogo aberto sobre o assunto. Se a parceria não sabe o que está acontecendo, pode não haver empatia e compreensão, culminando em distanciamento, culpa, ansiedade e depressão de ambos os parceiros. Algumas mulheres conseguem verbalizar como estão tristes pela falta de interesse pelo sexo e com o desconforto físico que o ressecamento vaginal acarreta, seja ele pelas mudanças corporais, como pela falta de lubrificação vaginal.
Algumas mulheres admitem que evitam quase todo contato físico e, por isso, não precisam falar sobre o que está acontecendo com elas. Alguns parceiros podem desenvolver disfunção erétil, por medo de machucar a parceira, após tentativas frustradas de sexo doloroso, desconfortável e com sangramento associado. Pode ser comum que os dois lados da parceria se perguntem se o amor acabou; mesmo quando um dos lados deseja que a intimidade física volte, muitas vezes nenhum dos dois quer iniciar a conversa, o que geralmente leva a um distanciamento cada vez maior
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Fonte: Mulher