Quando nos relacionamos vivemos um movimento onde esperamos sempre a ação do outro para reagirmos, via de mão dupla, toma lá dá cá.
Criamos expectativas sobre o que a outra pessoa é, o que pode ser, expectativa essa que, quase sempre, é frustrada.
Tendemos a fantasiar o outro com os sonhos que são nossos, com as características que queremos que eles tenham.
É sempre o que projeto no outro e o que procuro, as outras pessoas são projetos nossos.
O que queremos que elas sejam, quando deixam de ser, nunca foram, nos desanimamos.
É que Narciso acha feio tudo que não é espelho.
Isso acontece frequentemente em nossa vida real e, acontece com mais frequência, nas redes sociais.
Ninguém, veja bem, ninguém é o que manifesta em suas redes sociais.
Ali escrevemos uns textos, colocamos memes, compartilhamos informações, mas, arrisco dizer, que nem dez por cento do que sentimos, pensamos, cremos, publicamos.
Quem vê nossas publicações, memes, lê nossos textos acredita que nos conhece.
Quando fugimos da norma e daquilo que, comumente, publicamos, as pessoas ficam irritadas, desacreditadas, raivosas.
Como já disse a Pitty, não é minha culpa a sua projeção. Não mesmo.
Daí tolhem a liberdade de quem publica porque o que ela publicou não condiz com o ideal criado por nós.
Do imaginário de quem seria aquela pessoa.
Viramos as velhas fofoqueiras que ficavam nas janelas observando a vida da vizinhança e comentando sobre tudo o que ocorria.
O que nos difere das velhinhas de tempos passados é que nossa janela agora é um celular, um notebook.
Contudo, continuamos cuidando da vida do outro, aonde vai, o que veste, o que come, o que ele/ ela disse, e depois desdisse.
Certo é que somos todos uns exibicionistas, seja o corpo, uma roupa, livros, leituras, comida.
Estamos o tempo todo dizendo ao outro o que gostamos ou não, buscando validação, pertencimento ou até subverter uma ordem.
No entanto, ainda assim, ninguém tem o direito de dizer ao outro como pensar, sentir e se manifestar.
Se nos incomodamos com o que as pessoas publicam nas redes sociais, se nos sentimos impelidos a controlar, censurar a vida de outras pessoas.
Será que não é o momento de nos afastarmos das redes sociais?
A expectativa sobre o que o outro é, a ideia de controle sobre a vida das pessoas é uma ilusão desde sempre.
Pais sobre filhos, amizades, relacionamentos amorosos.
Ganhando um Plus com as redes sociais onde um estranho passa a ser mais um projeto do que Narciso considera interessante ou não.
Nossa vida anda tão chata e sem sentido que precisamos, o tempo todo, cuidar do outro?
Famoso ou não, rico ou pobre, caiu na rede é peixe.
Será julgado, avaliado, condenado ou, em alguns casos, absolvido.
Sou uma adepta contumaz das redes sociais, não creio que seja um instrumento do mal e propagador de engodo.
Mesmo manipulados constantemente e incitados às compras, ao consumo, aos likes, as redes sociais trazem a possibilidade de encontros, conhecimento, leituras, acesso a coisas que, comumente, não teríamos.
Nós somos os detentores do uso racional das redes sociais, o que consumimos na Internet.
A pergunta é: temos equilíbrio para isso?
Por que palpitar, corrigir, colocar possíveis soluções na vida de outras pessoas nos causa tanto interesse?
Estamos lançando aos outros nossas insatisfações, usando as pessoas como válvulas de escape para não lidar com uma vida desprovida de significado.
Enquanto rolamos o feed e comentamos a vida do outro, esquecemos das nossas próprias e somos anestesiados para não lidar com as dores do cotidiano.
Meu professor de História da faculdade dizia que todo mundo tem a sua cachaça.
Quando ouvi essa frase, tentei desvendar qual seria a minha.
Hoje percebo que uns descem aos bares para consumi-la, outros desbloqueiam a tela.
Desbloqueio a tela.
Tim-Tim!