ORAÇÃO AO TEMPO.

Não vejo a hora de chegar minhas férias.

Ansiosa pelo final de semana.

Quero que meu aniversário chegue logo.

Tomara que esse ano termine o mais rápido possível.

Vamos desejando que os dias se atropelem para a chegada de um possível momento.

Que, nem sabemos, se estaremos vivos para aproveitar.

Desde que, minha mãe adoeceu, peguei um apreço pelo dia.

Isso mesmo, pelo dia.

A doença dela me lembra que pode ir embora a qualquer momento.

E que, se desejo que os dias corram rapidamente, sem querer, estou desejando que ela parta rápido também.

Tenho plena ciência que meu querer não muda muita coisa e que não interfere em algo maior: a partida de alguém.

Mas sei, que aproveitar o hoje com essa pessoa, me faz viver intensamente a vida, a dela e a minha.

Gostaria de saber: por que temos tanta pressa?

A vida corre, não é mesmo (?), e quanto a isso não podemos fazer nada.

Mas por que a ânsia para que os dias passem logo?

Será que nossas vidas estão tão insuportáveis que não conseguimos lidar com o hoje?

Não sei quanto a você, do lado de cá, é todo dia de agradecimento.

E, não, não faço parte de uma nova doutrina good vibes.
Apenas despertei para o quanto é bom conviver com a minha mãe e sei da finitude dessa convivência.

Então é todo dia de comemoração quando desperto e sei que ela despertou comigo para ver uma novela, um filme, desenho ou assistir o Big Brother Brasil.

Programa que ela tem muito apreço e que eu, amante que sou, aprendi apreciar junto.

Convivo há anos com a Depressão.

Tratamentos variados entre medicações, psicoterapia, terapias alternativas.

Buscando sempre ficar bem.

A vida não pausa para podermos sofrer, às vezes você está nocauteado, e ela continua socando, porque quer saber até onde você aguenta.

Quando minha mãe adoeceu, estava segurando as cordas, quase levantando.

Daí recebo um soco que, pensei, sucumbirei.

A surpresa é que a doença dela e, todo cuidado que preciso ter com quem amo, me deu uma força que até hoje não entendo.

Sou feliz? Não, tenho a melancolia como característica de personalidade, mas sorrio com mais frequência.

Sorrio porque ela sorri comigo, porque a tenho para me dá bronca e porque posso retribuir a mesma.

Sorrio porque o amor me transborda quando a abraço e sinto o cheiro de mãe.

Fico feliz porque tenho a melhor amiga comigo sempre.

A poetisa do lar, a debochada, a audaciosa.

Os dias tornaram-se como de um adicto que sabe a importância do hoje.

Sem pressa, sem orações, para que as nuvens corram rápido e que sol e lua se revezem enlouquecidamente.

Joguei fora o controle remoto do filme Click e passei usar o show motion do filme A Melancolia.

O que antes me dava tédio e peso, hoje, admiração, sossego para o olhar, pausa para a escuta.

A vida ficou linda? Não. A vida ficou o que é.

As pessoas correndo lá fora, se atropelando, se desejando mal.

Aqui, no meu infinito particular, mamãe e eu estamos em câmera lenta.

Estou tentando gravar olhares, sorrisos e silêncios.

Quem sabe no futuro, se ele existir, possa abrir alguma caixa mágica e consiga vê-los novamente.

Quem sabe?

Hoje, faço uma oração reversa ao tempo.

Peço que passe devagar, que eu continue olhando com amor a quem me ama também.

Que possamos degustar nosso franguinho de panela juntas.

Que eu possa abrir a janela para o sol entrar quando me for solicitado.

Para minha mãe, o sol entra, para mim, ele já está dentro.

Tempo tempo tempo tempo, vou te fazer um pedido…