Mulher

Palavras que estamos cansados de ouvir.

Palavras que estamos cansados de ouvir.

Rola há algum tempo nas redes sociais ou até em revistas, dessas que sempre possuem um conselho pronto, palavras que se repetem veementemente e que, a mim, causam comichão.

Palavras que de tanto ler ou ver se repetirem ganharam até sinônimos novos.

Pois bem, explicado sobre o uso abusivo dessas palavras na Língua Portuguesa, agora faz-se necessário revelar essas palavrinhas que são até bonitinhas, mas que como música chiclete que se repete muito, uma hora, enche o saco.

Gratidão, resiliência e procrastinação, sangue de Jesus!

Duvido que você não fez uma cara de “aff” ao ler alguma dessas palavras.

O porquê de terem entrado tanto em voga, desconheço.

No entanto, toda vez que penso em seres de luz, porque só podem ser assim, cheios de gratidão ao universo, ou em pessoas resilientes, que são como bambus flexíveis e sempre voltam das piores tormentas à la Gisele Bündchen jogando suas lindas madeixas louras.

Sinto vontade de dar uns bofetões de realidade a essas criaturas que moram em Pasárgada[i]

E procrastinação que tem a cara do capitalismo moderno, aquele velho chato e turrão que não deixa ninguém respirar, não dá sossego, fica o tempo todo lembrando onde você falhou ou do que deixou de fazer.

O que é que tem demais deixar algo para depois? Por que tudo tem que ser agora?

Palavras da onda good vibes são, muitas vezes, utilizadas a esmo e desprovidas de sentido que geram, em criaturas como essa que vos escreve o seguinte pensamento: nem para lidar com perdas, frustrações e preguiça eu sirvo.

Já nem sei como utilizar gratidão sem me sentir uma yogi paz e amor com uma headband na cabeça , cabelão partido ao meio e mãos em quê? Isso mesmo, cumpadi, gesto de gratidão.

Já resiliência, quando leio ou ouço imagino uma casinha trancada a sete chaves que nunca terei acesso, isso é coisa de gente bem resolvida e eu ainda me encontro em resolução.

E, minha gente, são inúmeras preocupações no dia a dia, então podemos arrumar o guarda-roupa depois, ou organizar os documentos em outro momento.

Viva o ócio criativo, a capacidade e possibilidade de sentar e ler um bom livro, ver uma série bacana.

Comemoro as pequenas fugas, a possibilidade de não se prender a amarra nenhuma, estão inventando palavras para nos aprisionar.

Se é para sugerir palavras, vou de ideal liberal francês, liberdade, fraternidade e igualdade, em tempos que esse ideais tem nos custado muito caro, onde até mesmo aqueles que se autointitulam questionam a validade do mesmo.

Ao contrário das outras palavras que estão esperando uma new age, esperando o momento certo para ocorrer, estas estão muito presentes, ou pelo menos deveriam estar.

Estão por aí, no teu vizinho gay, que você vira o rosto, no teu amigo negro que você desmerece a dor e na mulher que conseguiu uma promoção no trabalho e você disse que ela conseguiu, porque, com certeza, fez o teste do sofá.

Estão aí, esperando por menos hipocrisia e mais prática. Quer ser um verdadeiro good vibes? Comece utilizando palavras que estão rondando aí há muito tempo e que, talvez, com o uso podemos entrar na era dos pássaros livres, borboletas de inúmeras cores e a tão sonhada Pasárgada.

Daqui a até lá, mudemos o vocabulário, a Língua Portuguesa é rica e ninguém aguenta mais ouvir sempre as mesmas palavras chatas com tantas outras com possibilidade de uso.

Pegue essa sua gratidão e, isso mesmo, leve para onde você quiser!

Nós agradecemos…
 


[i] Vou-me embora pra Pasárgada poema de Manuel Bandeira, publicado em seu Livro Libertinagem de 1930

Sugestão de leitura: Outros jeitos de usar a boca, Rupi Kaur