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Juíza de Boituva condena Latam a indenizar passageiro por racismo em voo

Juíza de Boituva condena Latam a indenizar passageiro por racismo em voo

O Juizado Especial Cível de Boituva condenou a Latam a indenizar, por danos morais, passageiro que foi vítima de racismo durante um voo em que foi obrigado a trocar de assento e constrangido por uma oferta para repartir bebida com outro passageiro, sentado à frente, que também era negro.

A quantia foi fixada em R$ 10 mil. De acordo com o processo, o autor viajava de Natal para São Paulo quando vivenciou duas situações durante o voo.

Israel Mendes da Silva, negro,  comprou passagem com pagamento adicional para o uso do chamado  assento confort, que fica ao lado de saída de emergência com mais espaço para os passageiros.

Foi abordado por uma comissária com alerta de que não poderia usar seu tablete em mãos naquele assento e deveria desligar o aparelho ou mudar de lugar. Mudou. E viu que outros passageiros brancos, seguiam nos assentos confort usando seus aparelhos. Fotografou a cena.

Pouco depois, solicitou uma batata e um refrigerante. A comissária, ao entregar os produtos, perguntou se ele gostaria de um copo a mais para dividir com outro passageiro, também negro, que estava sentado perto, ainda que os dois não tivessem mantido nenhum contato pessoal durante todo o voo.

Para a juíza Liliana Regina de Araújo Heidorn Abdala, a conduta da comissária “é claramente uma forma de privilégio, transcendendo o mero aborrecimento”.  

“Tratar o comportamento da funcionária da empresa como prática normal é fomentar o racismo velado, aceitar com normalidade a conduta de se presumir que dois negros viajando em um mesmo voo se conheçam e mantenham de qualquer forma um vínculo, apesar de não terem tido nenhum tipo de contato durante toda a viagem, a ponto de dividir a mesma bebida, é fomentar a conduta de preconceito racial baseado”, afirmou.

Na sentença, a magistrada cita autores que abordam o racismo estrutural, incluindo o psicanalista Carl Jung, e estudos sociais sobre racismo. 

“Com um histórico de mais de trezentos anos de escravidão e a ideia de hegemonia dos brancos em relação aos negros fomentou-se a crença de que o domínio de um grupo em relação ao outro é uma prática comum e aceita (in O Homem e seus símbolos)”, diz a sentença.

A Latam alegou durante o processo que os outros passageiros autorizados a usar equipamentos carregavam celulares menores, que não seriam problema em necessidade de mobilidade.

“Conforme demonstrado em audiência de instrução o autor estava utilizando um tablet pequeno no momento em que foi abordado pela comissária de voo, com dimensões semelhantes a um aparelho celular. Tal prova em nenhum momento foi refutada pela requerida que em contestação”

E completa: “não restam dúvidas de que houve prática de racismo e que pelas condições em que foi praticada fundamentam a concessão de indenização pelos danos morais sofridos.”

Acesse aqui a íntegra da decisão