Mosaico de coisas ruins

O Brasil vive um mosaico de coisas ruins: fome, corrupção, desvalor da vida humana, sucateamento da República, incompetência política e administrativa e golpes silenciosos.

Temos do Estado de Exceção – quando o direito não nos protege mais – ao cesarismo/bonapartismo; passando pelo famoso Estado Paralelo: neste último caso, o exemplo clássico se apresenta em Mato Grosso do Sul, em que policiais e capangas assassinam indígenas. O Estado regular convive em suas fileiras com grupos da morte.

Em São Paulo é um pouco diferente, pois as milícias infiltradas na Polícia Militar constituem grupos de extermínio que agem para liquidar pobres e negros. Sob a alegação de que matam “bandidos”, assassinam jovens negros e pobres sem passagem pelo sistema prisional. Como se a dita passagem fosse uma autorização para matar.

A diferença talvez esteja na motivação: no MS a PM age a mando do capital latifundiário, do agronegócio, dos ruralistas e com a conivência de parlamentares que atuam na Bancada BBB (Boi, Bala, Bíblia). Em SP, os policiais agem por motivação nazi-fascista – como alguns do Rio de Janeiro – e podem ou não receber subsídios dos empresários locais. No RJ, em outra diferença, as milícias de policiais engajados na força militar ou já exonerados tomam o lugar dos traficantes.

Quanto ao cesarismo/bonapartismo também cabem algumas notas explicativas: pelo conceito de bonapartismo é mais ou menos específica a atuação do Estado na defesa legislativa, judiciária ou armada do capital ruralista. A relação entre Estado (legalidade ou não) e capital monopolizador (monocultura) é transparente. De dia, policiais atuam na reintegração de posse em reserva indígena (sic) e à noite formam milícias de pistoleiros: assassinos e torturadores.

No plano do cesarismo, parlamentares e outras autoridades atuam no Estado ou em Brasília para tomar posse das terras indígenas ou dos quilombolas. Os órgãos responsáveis pela fiscalização dessas áreas são dormentes: recursos destinados a bens absolutamente fundamentais, como a compra de água potável, são desviados e nenhuma providência é tomada.

Em Brasília a Bancada BBB corre para aprovar a PEC 215, a fim de anular as demarcações já realizadas. Além de instituírem a deslegitimação dos laudos técnicos apresentados anteriormente por equipes de antropólogos sérios e honestos.

Em São Paulo, o cesarismo é o próprio Poder Político. Pois, milhares de escolas são/serão fechadas e nem mesmo o Ministério Público investiga as razões de tal descalabro. Não tivessem os próprios alunos ocupado os prédios, com a polícia em seu encalço, tudo seguiria a “ordem natural das coisas”. Em Minas Gerais o terrorismo ambiental transformou uma cidade em zona lunar, mas a mídia credita o fato a um tremor de terras que nenhuma criança sentiu.

Em São Paulo, o governo ainda emprega meios autocráticos – da fina flor da ditadura militar – para impor sigilos seculares na consulta popular de informações, em casos de suspeita de grave corrupção pública: como é o caso do Metrô ou da própria violência policial.

Há que se lembrar que acima de tudo isso corre em paralelo – como incremento legal da ditadura constitucional – a Lei Antiterror assinada pelo Executivo central. Tem a chancela do Ministro da Fazenda, a mando da Presidência da República, e será destinada aos meninos pobres do RJ, aos movimentos sociais e aos Black Blocs.

E, como se não bastasse, a corrupção é maior do que a miséria humana – e que cresce com os lucros bilionários dos bancos: 99% da população dão um jeitinho na coisa pública. Muitos também participam de pilhagens e de linchamentos públicos. Ou seja, na ordem fascista nacional, temos um povo corrupto que quer um governo honesto.

Temos uma cultura violenta – homofobia, racismo, machismo – que nem sequer consegue soletrar Democracia. Temos/teremos um direito patrimonial que surrupia noções do senso comum acerca do mínimo Estado de Direito.