Nos EUA, o juiz Sérgio Moro diz que a Operação Lava não é novela ou seriado e que, por isso, não deve ter capítulo toda semana. Concordo e discordo. Concordo que precise se aprofundar em cada pegada deixada no mapa da mina, antes de agir.

Discordo porque as listas apreendidas têm personagens que dariam filmes muito, mas muito melhores do que O Poderoso Chefão. Também discordo porque, agora que esquentou a trama, não é hora de recuar.

Desse modo, a lógica nos leva a crer que é preciso revelar todos os nomes dos personagens, do graúdo ao miúdo, dos atores principais aos figurantes, e das empresas que pagaram para ter seu selo nas telinhas e nas telonas do noticiário político e policial.

Por que recuar agora? Sintoma de alguma coisa? Mudou o modus operandi? Uma vez que mudou os métodos da operação, como vemos na última cena, minha recomendação é de que siga o bom senso e a lógica.

No rigor do método investigativo, ainda indico seguir o caminho do EMPIRISMO. E o que é esse empirismo? Para simplificar: retome as listas, leia todas as inscrições, colha provas substanciais contra todos, aplique a lei – só a lei.

Para o verdadeiro pesquisador, não há indício refutado antes de a pesquisa acabar, não se conclui antes de olhar todas as provas. O empirismo ensina a olhar a realidade nua e crua, a não ceder diante daquele que não quer ser flagrado.

O cientista não pode correr o risco de falsear a verdade, escolhendo por amostragem o que lhe interessa; até cursando graduação, o bom pesquisador depara-se com o contraditório. Deve procurar na escuridão dos fatos.

O juiz, além de versado no contraditório, é uma espécie de pesquisador e deveria escarafunchar todos os nós que estão pululando a sua frente. Veria que a pesquisa é um seriado sim, que exige disciplina e regularidade. Alguns juízes são cientistas.

Por fim, ainda que se pense que o seu trabalho não é novela – não me lembro se há filme –, sugiro que leia Francis Bacon, genial e controverso filósofo do Renascimento. Não conheço, mas deve haver algum juiz que tenha lido Bacon.

Veria em Novum Organum como proceder para não se furtar à lógica dos fatos. Aplicando-se ao empirismo, saberia que, por ação natural dos fatos contrários às suas teses, é o princípio do contraditório que revela a verdade. Os disparates também aparecem nessa hora. Portanto, a justiça não pode mudar de canal, em efeito zapping.

Tire um tempo nas viagens para saber que Bacon foi o pioneiro dos modernos e o último dos antigos. Como fundador da Ciência Moderna, Bacon recebeu críticas: como a de ser oportunista e de forjar elementos para se beneficiar.

Bacon viveu a consolidação do absolutismo na Inglaterra, experimentou o Renascimento e a expansão do capitalismo. Desde logo compreendeu que, em meio a tantos conflitos trevosos, as forças decisivas eram as da inteligência e do saber.

Bacon sabia que o experimentalismo científico deveria trazer benefícios à vida prática. Neste afã, estudou obras de metalurgia, química, geologia, quando desenvolveu entusiasmo pela técnica: pólvora, imprensa, bússola.

Como fez o juiz, Bacon também se bacharelou em Direito e exerceu a advocacia. Depois, com seus Ensaios, entrou para o mundo clássico da literatura inglesa. Ainda se aproximou da obra de Maquiavel – considerado o fundador da Ciência Política.

Como a dar provas de que era um ótimo maquiavélico, Bacon foi protegido do Conde Essex, mas não teve dúvidas em colaborar para sua execração a pedido da Rainha Elizabeth. Acusava-se o Conde de, exatamente, ter cometido sedição ou crime contra o Estado. O conde acabou executado e se salvou a Razão de Estado.

Parece urgente forçar uma “decupagem” das cenas tórridas de nossa República. Não podemos assistir ao nosso seriado de Al Capone, amanhã. Também não temos Os intocáveis e nem CSI. Então, que rolem todas as cenas, sem seletividade. Juízes e cientistas não podem fazer alianças com o poder. FIM!