Uma resolução do Conselho Superior do Ministério Público Militar (CSMPM), publicada na última quarta-feira, passa a permitir que militares da ativa possam ser beneficiados por acordos de não persecução penal quando praticarem crimes comuns.
Esses acordos, limitados a crimes que tenham pena mínima inferior a quatro anos, permitem que o acusado fique livre do processo mediante uma compensação negociada com o Ministério Público, como o pagamento de multa. Quem assina essa tratativa não é condenado e nem ganha ficha criminal e também não traz obrigação de admissão formal de culpa. Com isso, o processo deixa de existir. O acordo é diferente de uma delação premiada, em que há uma redução de pena, por exemplo.
O CSMPM é comandado desde abril de 2020 por Antonio Pereira Duarte, procurador-geral de Justiça Militar. Ele foi reconduzido ao cargo, para mais dois anos à frente do Ministério Público Militar, no início de maio deste ano. A resolução que abre a possibilidade de acordos com militares da ativa foi definida pelos conselheiros no último dia 24 de maio, vinte dias depois da posse de Duarte para seu segundo mandato.
Em setembro de 2018, o CSMPM havia aprovado uma resolução que previa a celebração desses acordos em crimes praticados por militares ou com a participação deles. Uma das exceções para essas propostas de acordo, no entanto, era para crimes praticados por militares da ativa. O texto era claro ao vedar a possibilidade de acordo quando “o autor do delito seja militar da ativa”. Em outubro de 2020, no entanto, o Conselho voltou atrás e, alinhado com decisões da Justiça Militar que vinham negando a possibilidade desses acordos, derrubou todo o artigo que previa a possibilidade de militares da reserva escaparem de processos mediante assinatura de tratativa com o Ministério Público Militar.
De maneira geral, o entendimento era de que o Código de Processo Penal Militar impediria a aplicação desses acordos pelo fato de os militares terem de respeitar os princípios de hierarquia e disciplina próprios da legislação militar. Essa controvérsia jurídica foi admitida na sessão de 24 de maio, quando o Conselho Superior decidiu retomar a possibilidade de acordos de não persecução com membros das Forças Armadas. “Nesse assunto, eu acho que o Ministério Público Militar ainda está tateando”, afirma o relator da proposta, conselheiro Alexandre Concesi.
Mesmo com a ponderação, o entendimento dos conselheiros foi de que, quando se tratar de crime comum, os acordos poderiam ser celebrados. A única diferença relevante em relação à norma de 2018 é que caiu a vedação a acertos com militares da ativa. A condição agora é que os acordos podem ser propostos desde que esses crimes não tenham afetado “a hierarquia e a disciplina” militar. A definição sobre esse ponto, no entanto, deverá ser “devidamente justificada”, o que abre espaço para análises caso a caso.
O conselheiro Carlos Frederico de Oliveira Pereira apresentou a preocupação de que fosse “inconstitucional” a inclusão de militares entre os beneficiários de acordos de não persecução por meio de uma resolução, já que ela estabelece especificações referentes apenas a membros das Forças Armadas, que não valem para acordos envolvendo civis.
“Eu entendo que é inconstitucional. [A mudança] teria que vir através de uma lei. Por ato de resolução, eu entendo que não é possível”, disse o conselheiro. “Mas se os senhores concordarem, eu voto nesse sentido [que permite o acordo para militares que pratiquem crime comum], mas eu faço essa observação. Para mim isso não é constitucional não.”
Entre crimes com pena mínima inferior a quatro anos, não hediondos, e que podem eventualmente envolver ações de militares em atividade estão, por exemplo, constrangimento ilegal, ameaças, violação de domicílio, furto, dano, entre outros.
*Por Bela Megale
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