No ano passado, durante a reunião anual em Davos, as 120 maiores empresas do mundo apoiaram os esforços para desenvolver um conjunto básico de métricas e formas de divulgação comuns sobre ESG (sigla em inglês para padrões ambientais, sociais e de governança). Desde então, a diversidade deixou de ser uma agenda do setor de recursos humanos para virar exigência dos investidores.
Nesse cenário, o desafio é conseguir se tornar um espaço amigável a todos os funcionários, o que passa por maior capacitação das equipes, aumento nos benefícios não obrigatórios e atração do público LGBTQIAP+ nos processos de recrutamento. O trabalho remoto na pandemia mostrou ainda que a atenção à saúde mental dos funcionários e o apoio oferecido pelos grupos de afinidade são importantes.
“Além do luto causado pelo vírus, acompanhamos o luto de pessoas LGBTQIAP+ no isolamento social. Alguns passaram a ter convívio maior com familiares que, infelizmente, não aceitam sua sexualidade e sofreram violências psicológicas e físicas. Na empresa, conseguem ser eles próprios”, relata Fabiana Cardoso, líder de Diversidade e Inclusão da IBM Brasil.
Por conta das restrições sociais, o grupo de afinidade da GE para a sua comunidade LGBTQIAP+ repensou sua atuação à distância. Uma das ideias foi a mentoria reversa sobre orientação sexual, em que o funcionário conversa com o topo da liderança. Pelo menos uma vez por mês, Viveka Kaitila, presidente da GE, participa de uma conversa virtual com Miriane Camargo, líder do grupo Pride Alliance.
“Temos um papo franco e honesto , dividimos experiências, ela me ensina e me corrige e, juntas, pensamos como podemos mudar a situação de pessoas que vivenciam dificuldades e discriminações”, conta Viveka.
Do lado da funcionária, não há constrangimento. Miriane leva seu conhecimento e fala de suas experiências. A última sessão foi sobre assumir a sexualidade no trabalho.
“Estudos mostram que pessoas LGBTQIAP+ levam 30% do tempo de trabalho pensando em seu comportamento. Demorei muito para falar sobre o assunto por ser discreta e por medo da hostilidade de colegas, mas isso não aconteceu.”
“Sair do armário” nos meios corporativos é um desafio para muitos, por isso as empresas devem deixar bem transparentes suas políticas em relação ao tema. Alexandre Santos, analista de finanças em Quote to Cash na IBM Brasil, lembra que, quando começou na empresa, não falava sobre seu namorado com a mesma naturalidade com que os colegas heterossexuais falavam das suas. O grupo de afinidade o ajudou neste processo.
“É um lugar seguro para que as pessoas possam conversar sobre qualquer assunto e ter a certeza que aquilo não vai sair dali nem criar um burburinho”, diz.
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Uma pesquisa realizada pelo Ideia, instituto de pesquisa de opinião pública, mostra o tamanho do desafio de ter um ambiente diverso. Seis em cada dez brasileiros defendem a meritocracia acima de políticas de inclusão. Ou seja, acreditam que a valorização profissional deve ser feita exclusivamente pela capacidade, e não com enfoque em gênero, cor e sexualidade.
“Os brasileiros verbalizam seus valores, mas não abrem mão dos privilégios. Todos entendem os problemas, mas não estão dispostos a cobrir os custos”, considera Maurício Moura, fundador do IDEIA e professor da Universidade George Washington, nos EUA.
Por conta deste pensamento, empresas que veem a diversidade como valor, precisam capacitar liderança e corpo de funcionários, o que inclui mudanças no recrutamento e no treinamento, além de escuta ativa e canais de denúncia.
Este tipo de iniciativa tem impactos financeiros. Um estudo da consultoria McKinsey&Co mostra que empresas percebidas como tendo mais diversidade de orientação sexual na liderança têm probabilidade 25% maior de superar a performance financeira de seus pares.
Na L’Oréal Brasil, 13% dos líderes são auto declarados LGBTQIAP+, conta Mariana Salgueiro, diretora de Kérastase e Redken e porta-voz do pilar LGBTQIAP+ da empresa:
“Sabemos que podemos ir além”, diz ela, para quem a inclusão é uma poderosa alavanca de desempenho. “Entendemos que é nosso papel proporcionar um ambiente de trabalho seguro e inclusivo. Todos os times e todas as pessoas, independentemente da senioridade, precisam compreender e internalizar seu papel na inclusão”, explica.
Mas esse processo ainda precisa melhorar. A Transemprego tem 25 mil currículos de pessoas trans, sendo 40% com ensino superior, e, apesar das contratações terem crescido, ainda são insuficientes:
“As excludências são maiores para pessoas mais à margem, inclusive no acesso à educação e ao mercado de trabalho. Um dos desafios é falar de interseccionalidade. As contratações ainda são eugenistas”, analisa Maite Schneider, cofundadora da Transempregos.