Em comemoração ao Dia do Orgulho LGBT, a drag queen Salete Campari decidiu convidar algumas amigas pioneiras do meio drag para compor o line-up do seu show virtual, que vai ao ar neste domingo (28), às 18h. A artista de 51 anos já é uma grande conhecida do público, não apenas por ser um ícone da noite paulistana, mas pelas participações em programas de TV misturando sua imitação de Marilyn Monroe com o inconfundível sotaque paraibano.
Ao iG Gente , Campari garantiu que sua live não é uma resposta à Parada do Orgulho LGBT virtual realizada no último dia 14 , que deu o que falar dentro da comunidade por ter esquecido grandes nomes da história do movimento.
Presente na primeira Parada do Orgulho LGBT de São Paulo, em 1997, Salete confessou que ficou triste por não ter sido convidada. Todos os anos, a Parada atrai milhões de pessoas para a Avenida Paulista e, este ano, por conta do novo coronavírus, realizou uma versão virtual com a ajuda de patrocinadores.
Por outro lado, a artista afirmou que não quer brigar com ninguém por conta do ocorrido e que quer apenas celebrar o amor. “Claro que todas as minhas amigas ficaram tristes, eu também, pelo acontecido, mas agora é a hora de a gente se unir e celebrar o amor e a igualdade entre todos os gêneros”, esclareceu por telefone.
Já a amiga e também drag queen Kaká di Polly não teve medo de cobrar uma explicação da Associação da Parada do Orgulho LGBT de São Paulo (APOGLBT-SP). Intitulada madrinha do evento, a artista relembrou a vez em que precisou deitar na frente dos carros para que a primeira edição da Parada acontecesse.
“Ninguém vê o nosso movimento que foi feito ao longo de mais de vinte e tanto anos de Parada e de militância. Eu visto peruca na cabeça há 46 anos e sempre estive brigando pela minha classe. Se hoje eles podem estar aí no Youtube, dando close no Facebook, passeando com camisetinha do arco-íris de mãozinha dada com os namoradinhos deles é porque o nosso trabalho fez com que hoje eles pudessem estar aí desse jeito” afirma Kaká.
Sem patrocínio
Salete, que está há mais de 30 anos no showbizz, não conta com nenhuma ajuda de custo ou patrocínio para a produção de seu evento online com as drags pioneiras. Mas isso não a impediu de seguir com o projeto. “Eu estou fazendo uma loucura de fazer um grande evento, do meu programa, para contemplar todos os meus amigos em um dia que é muito especial para mim. Ano passado, ganhei o prêmio Stonewall pelos 50 anos de militância e eu quero dividir isso com todo mundo”, disse Salete, que apesar de estar arcando com tudo, já agradece qualquer tipo de contribuição monetária que possa vir do público.
Além de cobrar explicações pelo esquecimento de algumas drags mais velhas, Kaká di Polly, por sua vez, também pediu um prestação de contas por parte da Associação sobre o dinheiro arrecadado na Parada online do último dia 14. “Eles monetizam tanto, com tantos anunciantes, com tantos apoiadores, com QR Code pedindo dinheiro… aí eu paro e pergunto ‘quanto é que foi doado pelo QR Code, quanto é que eles juntaram em dinheiro e com todos esses patrocinadores?’ E esse dinheiro está aonde? Quem presta conta desse dinheiro? Não é a associação? Onde foi parar este dinheiro?”, questionou.
“A gente está se reinventando”
Durante a pandemia do novo coronavírus, as drags queens também estão tendo que se reinventar e conseguir dinheiro de outra forma, por exemplo, fazendo lives. Por telefone, Silvetty Montilla desabafou que esse tem sido um período muito difícil, mas que não pode perder sua fé. “Já faz três meses que eu não faço nada. Está sendo difícil, mas a gente está se reinventando. Eu vendo rifa, faço algumas lives para empresas que gente cobra um cachê. É difícil, porque nós somos os primeiros a parar e provavelmente seremos os últimos a volta”, contou a artista.
Montilla também comentou sobre a opção de recorrer ao auxílio emergencial nesse período. “Hoje em dia, qualquer cinquenta reais que entra na vida da gente é válido, porque para você que tem um padrão de vida, onde você trabalha, ganha, faz as suas coisas e de repente se vê há três meses sem fazer nada, sem ganhar um real é difícil. Então, tudo que entrar e vier para a gente é lucro”, explicou.
Silvetty é uma das mais famosas artistas do meio drag. Humorista, ela já participou de diversas peças teatrais e programas de TV. Sua história já foi retratada em um livro intitulado “É o Que Tem pra Hoje!!! – A Trajetória do Maior Transformista do Brasil”.
Vendo tantos amigos perdendo seus trabalhos devido ao fechamento de bares e boates durante a quarentena, Kaká di Polly sugere que a APOGLBT-SP distribua os recursos arrecadados com a transmissão do dia 14 para membros da comunidade. “Por que não pega esse dinheiro e usa para chamar os artistas que estão passando fome, que não têm como pagar seus aluguéis e que não têm como fazer nada e faz uma fila de gente lá na Associação da Parada e dá um cheque de mil reais para cada um? Porque eu sei que falaram por aí que teve patrocinador que deu cerca de um milhão de reais”, afirmou.
Afastada há cinco anos do maior evento em prol do orgulho LGBT, Silvetty disse que se entristece em ver que no Brasil pouco se valoriza a história traçada pelos artistas mais velhos dentro do movimento. “Pena que o Brasil não tem memória, eu falo mais por São Paulo. Aqui não reconhecem as pessoas que deram cara a tapa e que mostraram as suas caras na primeira Parada.”
Além de Silvetty e Kaká, a live do “Corujão da Salete”, que acontece neste domingo (28) às 18h, contará com: Arthur Zanetty, Thalia Bombinha, Paulette Pink, Divina Núbia, Lyza Bombom, Dany Cowlt, Márcia Pantera, Maryana Mercury, Carla Hellen, Antara Gold, Dimmy Keer e Marcinha Corintho.
Procurada, a Associação da Parada do Orgulho LGBT de São Paulo disse que os convites de Silvetty e Salete foram, sim, enviados. “Os convites foram enviados por e-mail, divulgados em redes sociais nos canais delas, no caso da Silvety e Salete, como os demais convidados, e ainda enviamos mensagem pelo Instagram que constava como lido.”
Quanto às alegações de Kaká, a assessoria informou em nota ao iG que a APOGLBTSP iniciou há dois meses a Campanha Parada Pela Solidariedade que ajuda artistas LGBTs em situação de vulnerabilidade.
“Sobre a ajuda as pessoas LGBT+ em situação de vulnerabilidade e a artistas, a APOGLBTSP, iniciou a dois meses a Campanha Parada Pela Solidariedade, onde – até a presente data – distribuímos mais de 2000 cestas básicas. Temos um cadastro com 200 pessoas que são atendidas com cestas básicas, kit de higiene e limpeza, roupas, 1000 cobertores, mais de 6000 refeições mês através da ajuda ao Projeto Seforas, barracas. Além disso, a APOGLBTSP através da Live do Orgulho doou para outras ONGs recursos em dinheiro, para usarem em suas demandas, contemplamos as seguintes instituições: Casa Florescer 1 e 2, Família Stronger, Grupo Pela Vidda, Projeto Seforas, ONG Arco Íris de Ribeirão Preto, Fórum Potiguar/RN, Comunidades indígenas de Iguape e Peruíbe, Parada LGBT de Itanhaém, Comunidade Cigana de Taubaté e artistas circenses e ainda continuamos a ajudar as pessoas. Todos os recursos aportados, seja por doação em dinheiro ou produtos, que ao final da ação será prestado contas. Lembrando que essa ação, quando foi criada, era para ajudar a comunidade LGBT+ logo no início da pandemia, e por um período definido.
A APOGLBTSP amplamente divulga em suas redes sociais, para as pessoas ajudarem ou serem ajudadas, inclusive artistas da noite e pessoas em situação de rua estão sendo auxiliadas, no caso a pessoa não acompanha nossas redes sociais e não sabe que nossa prestação e de nossos parceiros desta ação acontece diariamente praticamente.”