O Colégio de Consultores, uma das mais importantes e sólidas estruturas da Diocese de Marília, promoveu uma reunião especial na semana passada e deve fazer circular nos próximos dias uma carta ao clero e aos fiéis de Marília para enfrentar o que pode ser o maior caso de ataques a párocos da cidade e região.
Envolve pelo menos sete padres, alguns com décadas de atuação na Diocese, e um conjunto de informações que perde força por serem divulgadas de forma anônima, mas que ganha impacto pelo conteúdo dos ataques e por incluir imagens e detalhes.
A carta a ser distribuída é o segundo documento oficial da Cúria a respeito do caso desde que as informações começaram a circular entre párocos, em maio deste ano. O caso chegou agora ao Giro Marília.
A primeira manifestação oficial, naquele mês, foi uma circular em que a Diocese trata a situação como “a realidade desagradável, anônima e conflituosa que nestes últimos dias se abateu sobre nossa Igreja.”
A maior parte do ‘dossiê’ trata de infrações ao celibato e acusações de ordem moral – relações amorosas, imagens de participação em conversas por vídeo em site de encontro, relacionamentos em imóveis da Igreja -. Mas há situações que podem ir além do direito canônico e invadem a esfera da Justiça comum.
São casos como o de uma funcionária que teria sido demitida para conter a circulação de informações, desvios de recursos de obras para uma paróquia na região e assédio sexual. Há ainda acusação do uso de laranjas para abertura de empresas com recursos de paróquias na região.
A acusação diz que em um dos casos um pároco teria sofrido extorsões e chantagem. A divulgação anônima dos documentos envolve a possibilidade que o responsável pela circulação das imagens e acusações seja o chantagista.
A divulgação das cartas da Cúria revela as medidas externas da Diocese. Eventuais medidas internas segue uma tradição da instituição: mesmo que algum procedimento tenha sido aberto, ele é rigorosamente sigiloso.
O Giro Marília recebeu cópias dos documentos e procurou a Diocese para levantar informações sobre as medidas tomadas. A carta do Colégio de Conselheiros é uma resposta aos questionamentos e à nova circulação dos documentos com os ataques.
“A Igreja não pode atuar a partir de denúncias anônimas. Diante de denúncias formais (assinadas pelos denunciantes) e com indícios de veracidade, a Igreja prevê investigação sigilosa, processos e penas”, diz o documento.
A carta indica ainda que durante o período de atuação do bispo Dom Luiz Antonio Cipolini na Diocese “todas as denúncias assinadas e datadas que chegaram até ele, pelos meios legais de informação, foram e estão sendo investigadas”. A carta é assinada por seis padres que integram o Colégio – clique aqui para acessar a carta na íntegra -.
Mas há indicadores de que pessoas próximas ao bispo participam na circulação das informações. Enquanto aguardava a manifestação da Diocese, o Giro Marília recebeu uma segunda mensagem do responsável pelo dossiê: ele soube que os documentos foram levados à Diocese.
Na primeira circular, divulgada em maio depois que o dossiê foi enviado a padres e fiéis, Dom Luiz cita avanços e conquistas da Diocese, como a ordenação de nove candidatos em evento com participação de 3.000 pessoas, e diz que “o conflito não pode ser ignorado ou dissimulado; deve ser aceito”.
A circular lista três medidas adotadas pela Diocese naquele momento:
– Solidariedade e todos que receberam a carta e “estão admirados com tamanha maldade, na divulgação anônima das imagens criando condições obscuras para condenar uma pessoa. Somos solidários com todos(as) na dor e na oração e não compactuamos com esta prática”.
– Procura por meios legais para prazer a respeitabilidade da Cúria Diocesana, “que consta daqueles organismos e pessoas que colaboram com o Bispo no governo da Diocese”.
– Aceitar “’suportar o conflito’ para resolvê-lo e transformá-lo no elo de um novo processo”. Clique aqui para acessar a íntegra da circular.
O anonimato nas acusações emperra até investigações formais na Justiça comum. Há instrumentos para que denunciantes com medo de represálias possam ser preservados. Não há informação de que nenhum deles tenha sido buscado pelo denunciante junto à polícia ou ao Ministério Público nos casos de crimes comuns – assédio, desvios, perserguição de trabalhadores-.
Mas a circulaação da carta entre párocos e fiéis, a movimentação da Cúria em dois documentos oficiais, a reunião do Colégio de Conselheiros e até os procedimentos de investigação junto aos Correios institucionalizam o caso. Faltam respostas para o que pode ser crime e faltam medidas para apurar o envolva crimes de calúnia, difamação, injúria e até extorsão na divulgação das mensagens. O caso faz seis meses e pode estar só começando.